XC Quixadá November 2009 from flyfrei on Vimeo.
Monday, January 04, 2010
Friday, August 14, 2009
Tuesday, January 20, 2009
Sobre Quixadá, seus ventos e térmicas, suas nuvens e pousos.
Olá amigos, faz muito tempo que não escrevo, e infelizmente o motivo é a morte do piloto André. Meus pêsames sinceros à família e aos seus amigos. Talvez o André não soubesse direito sobre o lugar onde ele estava indo voar, as condições reais de vôo em Quixadá durante o ano, particularmente nos meses de Agosto até meio de Dezembro. Por isso resolvi vir à lista falar um pouco a respeito. Quem se interessar em saber mais sobre o meu sertão, aqui vão algumas peculiaridades de Quixadá.
Não estou mais voando, mas durante 11 anos (sim, onze anos), Quixadá foi o meu lugar de vôo. Aprendi a voar lá. Adorava voar em Quixadá. Fazia em média 3 vôos por semana. Até fui trabalhar lá para poder voar mais. Foram com certeza quase mil vôos em Quixadá, nas condições mais diversas - e adversas -possíveis. Depois vou pedir a um amigo para postar alguns textos meus, saídos na Air, onde narro algumas peripécias com mais detalhes. Procurarei não ser prolixa agora, se não conseguir, me perdoem.
Quixadá é uma rampa baixinha, com apenas 280 metros de desnível, com pouso gigantesco à frente, e muitos pousos para trás, com trechos de roubadas, claro. Nos meses de janeiro a julho, a condição é de ventos médios a fracos, sendo médio para nós um ventinho de 15-20 Km/h. Nos meses de fevereiro a meados de junho, chove aqui, então vir de longe voar aqui nessa época é meio loteria, pois vai fazer pregos na maioria das vezes. Um dia ou outro vai estar bom e vai dar cross, mas isso só morando aqui e estando lá todo fds. De janeiro a julho, todo e qualquer piloto pode voar lá.
A partir de agosto o vento começa a aumentar, e o sertão vai perdendo o verde que ganhou nos meses de chuva. As térmicas ainda não estão tão fortes, pega-se no máximo 6m/s. Agora, a partir de setembro, o bicho pega. As rajadas ultrapassam 50 Km/h, algumas vezes mais de 60. Qualquer um que já veio no X-Ceará sabe que é verdade.
Setembro,outubro e novembro são meses extremamente secos aqui e de ventos muuuito fortes. Várias vezes eu esperava o vento "baixar" para 25-30 Km/h para conseguir decolar. Aprendi a cronometrar as rajadas, olhando a água do açude em baixo. Depois que decolar tem sair de perto do relevo (pra não correr o risco de cair no rotor) e pegar a termal logo mais à frente, se segurar nela. E ter cuidado, pois a termal
quanto mais baixa, mais turbulenta é. A decolagem tem que ser precisa.
Bem, saindo em direção ao cross o vôo é maravilhoso, o lugar é deslumbrante, cheio de monólitos. Há muita terra seca, pedras gigantes, pequenos açudes, e um pouco de mato verde, árvores cheias de espinhos que não secam. Juntando tudo isso temos um caldeirão fervilhante de calor com gatilhos de térmicas. É o paraíso para subir
velozmente. São fáceis de pegar termais de 8-10-12 m/s. poucas coisas no mundo devem ser tão prazerosas para um voador do que estar no miolo de uma térmica dessas. A vela parece nem se mexer, o vário emite um grito continuo, o chão vai ficando cada vez mais distante. É algo fantástico.
O grande problema é o antes e o depois desse paraíso "termístico".
Vamos lembrar apenas que em Quixadá o vento deverá estar 30-40 Km/h e na cauda vc estará voando a 70-80 Km/h. O ar em torno da termal linda de 10 não vai estar lisinho não, longe disso. Então é preciso extrema atenção antes de entrar nela, e ao entrar dificilmente vc acha o miolo logo, sua vela pode balançar muito se vc não estiver atento, isso vai causar um colapso que nem sempre é pequeno. Se entrar, segure a onda e trate de achar logo o centro, senão vai ficar chacoalhando igual nega maluca. À medida que se sobe, a termal vai ficando mais lisa.
Normalmente aqui as termais são de formações de nuvens, não termais de azul, como acontece muito em Brasília.
O teto também não é alto. De manhã fica em torno de 1200-1600 e depois do meio dia sobre a 2200-2300. Passar disso é entubar. A decisão é do piloto. Dentro da nuvem não se vê nada, só a imensidão branca. As linhas do parapente desaparecem a poucos palmos acima da sua cabeça.
Se a vela for clarinha, nem ela vc vê. Então tem que ser uma escolha muuuito bem pensada.
Eu já entrei em dezenas de nuvens, a maioria pequenas, subia relativamente tranqüila, nuvenzinhas de não mais de 500 metros da base ao topo. Mas eu tinha mais de cinco anos de vôo quando comecei a fazer isso, e havia aprendido voando de duplo com o Fleury. O problema é entubar em Quixadá, em baixo de um lindo cúmulo se formando e não saber até onde aquela nuvem crescer. Isso aconteceu comigo. Fui a 3900 metros, sai no alto da nuvem, tremendo de frio, encharcada, e com as mãos doendo de tanto segurar a vela, rezando para não tomar uma fechada e girar ou cair dentro dela. Nessa dita nuvem, que eu entrei só pra dar uma refrescada, subir mais um pouquinho, encher o tanque, quando eu tentei sair não consegui. Fiz orelhas, e de orelhas subia a 6m/s, pra vcs terem uma idéia do monstro.
Eu estava olhando o lugar do acidente do André e por triste coincidência, foi lá em Madalena que pousei nesse dia. Depois que vi no site o vôo do André no site XC, imaginei que poderia ter acontecido algo assim com ele. Entrar na termal, depois na nuvem, tentar sair e não conseguir, e ter tomado uma grande fechada e entrado em giro. Na nuvem vc perde o horizonte, girando não sabe se está em cima, de lado,
ou em baixo. Não sabemos o que aconteceu ao certo. Tantas coisas podem
ter passado pela cabeça dele nos primeiros giros. Talvez não tenha lançado o reserva com receio de jogá-lo dentro da vela, por não saber se estava em cima ou em baixo, sei lá. O problema é que em giro brusco não se tem muito tempo para pensar, pois a possibilidade de desmaio é muito grande. Tem-se que agir rápido, a não ser que seja alguém com grande experiência em ser submetido a vários Gs.
Em 2002, quando lancei meu pára-quedas em Quixadá( depois de um vôo de 120 Km, peguei uma convergência de termais de queimadas), eu estava a cerca de 150 metros do solo. Minha vela fechou quase toda, o giro foi muito brusco, não conseguia nem mover o pescoço para olhar o lado oposto ao giro. Acho que se eu demorasse mais dois segundos para puxar a alça do reserva não estaria aqui hoje pra relembrar a história. Eu tinha que lançá-lo porque estava a baixa altura, mas principalmente porque eu estava girando velozmente sem nenhum controle da vela tuistada. Se eu estivesse a 3000 metros teria feito a mesma coisa, porque eu não saberia quanto tempo estaria em consciência para tentar controlar a coisa toda. A altura pode passar a falsa idéia de que há tempo para corrigir. Há situações em que não há, se vc não estiver acordado para fazê-lo.
Outra coisa complicada em Quixadá, nos meses fortes, é o pouso. Há muita terra para pousar, muito pouso. O problema é vc pousar cedo, antes das quatro da tarde, porque a atividade térmica ainda está forte. Pousar antes das três é então super complicado para quem não tem experiência em condições extremas de termais e ventos. Alguns excelentes pilotos do Brasil e do exterior já se machucaram aqui justamente no pouso.
Normalmente eu ficava esperando a rajada passar lá em baixo, pra poder me aproximar rapidinho e pousar. Muitas vezes eu fiz orelhas, embora saiba que muita gente condena essa prática. É que é difícil ver a poeira subir rodopiando, a mata balançado, e deixar sua vela ali toda aberta, sem uma alta pressão. Bem ou mal feito, nunca tomei uma fechada a baixa altura fazendo isso. Preferia pousar de ré mais ainda, ir pro mato seco, ficar enganchada em espinhos, do que levar uma fechada a 20-30 do solo. Fechava as orelhas a uns 80 metros do solo, bem de frente pro vento, toda certinha, pra nada dar errado e provocar uma fechada. Jamais me machuquei em Quixadá, apenas uns arranhõezinhos básicos.
Muitas vezes, em Quixadá, vc pousa de ré. É estranho, vc de frente pro vento e a terra passando em sentido contrário. Quem quiser voar bem aqui, aprenda antes a domar a sua vela tão logo toque o solo, "matá-la" de imediato, para não ser arrastado. Fui arrastada muitas vezes (boa parte dos arranhões vieram daí), até desenvolver minha técnica. Mas cada um tem a sua.
Prometi não ser prolixa, mas acabei sendo. Há muitas outras coisas que se precisa saber para voar em Quixadá nessa época. O básico é isso.
Experiência em condições fortes de vento e térmicas ( pelo menos algo que seja 2/3 do que é aqui), bom preparo físico e psicológico, reflexos aguçados, vela compatível com seu nível de piloto, todos os equipamentos de segurança necessários( incluindo um bom capacete e botas), uma boa dose de humildade, seja para não decolar, esperar uma condição mais propícia, para fazer um pouso seguro mesmo o vôo não sendo tão longo quanto desejaria, ou lançar um reserva tão logo seja preciso. Isso já salvou muita gente aqui.
Ah, só mais uma coisinha. Os vôos no final da tarde são excelentes, o lugar é lindo, e mesmo decolando às quatro da tarde dá pra fazer 70 km.
Um grande abraço a todos. Bons e seguros vôos.
Mailcar Fernandes
Não estou mais voando, mas durante 11 anos (sim, onze anos), Quixadá foi o meu lugar de vôo. Aprendi a voar lá. Adorava voar em Quixadá. Fazia em média 3 vôos por semana. Até fui trabalhar lá para poder voar mais. Foram com certeza quase mil vôos em Quixadá, nas condições mais diversas - e adversas -possíveis. Depois vou pedir a um amigo para postar alguns textos meus, saídos na Air, onde narro algumas peripécias com mais detalhes. Procurarei não ser prolixa agora, se não conseguir, me perdoem.
Quixadá é uma rampa baixinha, com apenas 280 metros de desnível, com pouso gigantesco à frente, e muitos pousos para trás, com trechos de roubadas, claro. Nos meses de janeiro a julho, a condição é de ventos médios a fracos, sendo médio para nós um ventinho de 15-20 Km/h. Nos meses de fevereiro a meados de junho, chove aqui, então vir de longe voar aqui nessa época é meio loteria, pois vai fazer pregos na maioria das vezes. Um dia ou outro vai estar bom e vai dar cross, mas isso só morando aqui e estando lá todo fds. De janeiro a julho, todo e qualquer piloto pode voar lá.
A partir de agosto o vento começa a aumentar, e o sertão vai perdendo o verde que ganhou nos meses de chuva. As térmicas ainda não estão tão fortes, pega-se no máximo 6m/s. Agora, a partir de setembro, o bicho pega. As rajadas ultrapassam 50 Km/h, algumas vezes mais de 60. Qualquer um que já veio no X-Ceará sabe que é verdade.
Setembro,outubro e novembro são meses extremamente secos aqui e de ventos muuuito fortes. Várias vezes eu esperava o vento "baixar" para 25-30 Km/h para conseguir decolar. Aprendi a cronometrar as rajadas, olhando a água do açude em baixo. Depois que decolar tem sair de perto do relevo (pra não correr o risco de cair no rotor) e pegar a termal logo mais à frente, se segurar nela. E ter cuidado, pois a termal
quanto mais baixa, mais turbulenta é. A decolagem tem que ser precisa.
Bem, saindo em direção ao cross o vôo é maravilhoso, o lugar é deslumbrante, cheio de monólitos. Há muita terra seca, pedras gigantes, pequenos açudes, e um pouco de mato verde, árvores cheias de espinhos que não secam. Juntando tudo isso temos um caldeirão fervilhante de calor com gatilhos de térmicas. É o paraíso para subir
velozmente. São fáceis de pegar termais de 8-10-12 m/s. poucas coisas no mundo devem ser tão prazerosas para um voador do que estar no miolo de uma térmica dessas. A vela parece nem se mexer, o vário emite um grito continuo, o chão vai ficando cada vez mais distante. É algo fantástico.
O grande problema é o antes e o depois desse paraíso "termístico".
Vamos lembrar apenas que em Quixadá o vento deverá estar 30-40 Km/h e na cauda vc estará voando a 70-80 Km/h. O ar em torno da termal linda de 10 não vai estar lisinho não, longe disso. Então é preciso extrema atenção antes de entrar nela, e ao entrar dificilmente vc acha o miolo logo, sua vela pode balançar muito se vc não estiver atento, isso vai causar um colapso que nem sempre é pequeno. Se entrar, segure a onda e trate de achar logo o centro, senão vai ficar chacoalhando igual nega maluca. À medida que se sobe, a termal vai ficando mais lisa.
Normalmente aqui as termais são de formações de nuvens, não termais de azul, como acontece muito em Brasília.
O teto também não é alto. De manhã fica em torno de 1200-1600 e depois do meio dia sobre a 2200-2300. Passar disso é entubar. A decisão é do piloto. Dentro da nuvem não se vê nada, só a imensidão branca. As linhas do parapente desaparecem a poucos palmos acima da sua cabeça.
Se a vela for clarinha, nem ela vc vê. Então tem que ser uma escolha muuuito bem pensada.
Eu já entrei em dezenas de nuvens, a maioria pequenas, subia relativamente tranqüila, nuvenzinhas de não mais de 500 metros da base ao topo. Mas eu tinha mais de cinco anos de vôo quando comecei a fazer isso, e havia aprendido voando de duplo com o Fleury. O problema é entubar em Quixadá, em baixo de um lindo cúmulo se formando e não saber até onde aquela nuvem crescer. Isso aconteceu comigo. Fui a 3900 metros, sai no alto da nuvem, tremendo de frio, encharcada, e com as mãos doendo de tanto segurar a vela, rezando para não tomar uma fechada e girar ou cair dentro dela. Nessa dita nuvem, que eu entrei só pra dar uma refrescada, subir mais um pouquinho, encher o tanque, quando eu tentei sair não consegui. Fiz orelhas, e de orelhas subia a 6m/s, pra vcs terem uma idéia do monstro.
Eu estava olhando o lugar do acidente do André e por triste coincidência, foi lá em Madalena que pousei nesse dia. Depois que vi no site o vôo do André no site XC, imaginei que poderia ter acontecido algo assim com ele. Entrar na termal, depois na nuvem, tentar sair e não conseguir, e ter tomado uma grande fechada e entrado em giro. Na nuvem vc perde o horizonte, girando não sabe se está em cima, de lado,
ou em baixo. Não sabemos o que aconteceu ao certo. Tantas coisas podem
ter passado pela cabeça dele nos primeiros giros. Talvez não tenha lançado o reserva com receio de jogá-lo dentro da vela, por não saber se estava em cima ou em baixo, sei lá. O problema é que em giro brusco não se tem muito tempo para pensar, pois a possibilidade de desmaio é muito grande. Tem-se que agir rápido, a não ser que seja alguém com grande experiência em ser submetido a vários Gs.
Em 2002, quando lancei meu pára-quedas em Quixadá( depois de um vôo de 120 Km, peguei uma convergência de termais de queimadas), eu estava a cerca de 150 metros do solo. Minha vela fechou quase toda, o giro foi muito brusco, não conseguia nem mover o pescoço para olhar o lado oposto ao giro. Acho que se eu demorasse mais dois segundos para puxar a alça do reserva não estaria aqui hoje pra relembrar a história. Eu tinha que lançá-lo porque estava a baixa altura, mas principalmente porque eu estava girando velozmente sem nenhum controle da vela tuistada. Se eu estivesse a 3000 metros teria feito a mesma coisa, porque eu não saberia quanto tempo estaria em consciência para tentar controlar a coisa toda. A altura pode passar a falsa idéia de que há tempo para corrigir. Há situações em que não há, se vc não estiver acordado para fazê-lo.
Outra coisa complicada em Quixadá, nos meses fortes, é o pouso. Há muita terra para pousar, muito pouso. O problema é vc pousar cedo, antes das quatro da tarde, porque a atividade térmica ainda está forte. Pousar antes das três é então super complicado para quem não tem experiência em condições extremas de termais e ventos. Alguns excelentes pilotos do Brasil e do exterior já se machucaram aqui justamente no pouso.
Normalmente eu ficava esperando a rajada passar lá em baixo, pra poder me aproximar rapidinho e pousar. Muitas vezes eu fiz orelhas, embora saiba que muita gente condena essa prática. É que é difícil ver a poeira subir rodopiando, a mata balançado, e deixar sua vela ali toda aberta, sem uma alta pressão. Bem ou mal feito, nunca tomei uma fechada a baixa altura fazendo isso. Preferia pousar de ré mais ainda, ir pro mato seco, ficar enganchada em espinhos, do que levar uma fechada a 20-30 do solo. Fechava as orelhas a uns 80 metros do solo, bem de frente pro vento, toda certinha, pra nada dar errado e provocar uma fechada. Jamais me machuquei em Quixadá, apenas uns arranhõezinhos básicos.
Muitas vezes, em Quixadá, vc pousa de ré. É estranho, vc de frente pro vento e a terra passando em sentido contrário. Quem quiser voar bem aqui, aprenda antes a domar a sua vela tão logo toque o solo, "matá-la" de imediato, para não ser arrastado. Fui arrastada muitas vezes (boa parte dos arranhões vieram daí), até desenvolver minha técnica. Mas cada um tem a sua.
Prometi não ser prolixa, mas acabei sendo. Há muitas outras coisas que se precisa saber para voar em Quixadá nessa época. O básico é isso.
Experiência em condições fortes de vento e térmicas ( pelo menos algo que seja 2/3 do que é aqui), bom preparo físico e psicológico, reflexos aguçados, vela compatível com seu nível de piloto, todos os equipamentos de segurança necessários( incluindo um bom capacete e botas), uma boa dose de humildade, seja para não decolar, esperar uma condição mais propícia, para fazer um pouso seguro mesmo o vôo não sendo tão longo quanto desejaria, ou lançar um reserva tão logo seja preciso. Isso já salvou muita gente aqui.
Ah, só mais uma coisinha. Os vôos no final da tarde são excelentes, o lugar é lindo, e mesmo decolando às quatro da tarde dá pra fazer 70 km.
Um grande abraço a todos. Bons e seguros vôos.
Mailcar Fernandes
Thursday, July 03, 2008
Saturday, March 29, 2008
Monday, March 10, 2008
Monday, January 14, 2008
Wednesday, December 26, 2007
Friday, December 14, 2007
X-CEARÁ 2007 – A Participação Cearense (por Flávio Moreira)
A expectativa para o evento era já das melhores. Eu estava com um bom equipamento, havia realizado bons vôos de treino e ainda fui agraciado com uma ajuda de incentivo e patrocínio da Prefeitura Municipal de Pacatuba, do Dr. Aluísio Gurgel e do Neto Supiai. Então era só voar e ir o mais longe possível.
1º DIA DE PROVA. A maioria na rampa por volta das 6h30 e eu ligado na turma da Sol, pois pretendia acompanhá-los ainda que fosse apenas no início do vôo. Decolei às 7h00 junto com a galera da frente. A saída neste horário é crítica pois o teto passa pouco dos 700m e não se pode entubar. Tentei permanecer no bolo até onde parecia vantagem e segurar voando até a condição melhorar. Quem não tomava muito cuidado caía antes da Serra do Padre ou não chegava a Custódio. Fui boiando já sem companhia desde Algodões até Madalena, quando a condição deu uma melhorada. No vôo parece que todos são suspeitos e ninguém segue ninguém, a não ser por uma boa termal de motivo. E segui tranqüilo, sem problemas ou colapsos, até ficar muito baixo, logo atrás da cidade de Monsenhor Tabosa. A uns 30m do chão, bem no pé do platô e com vento de proa e fraco, finalmente começou a bombar muito fraco, mas consegui garantir o “lift” da serrona. Novamente segui para a rota. A surpresa foi no quilômetro 200: entrei numa descendente enorme pouco antes da Serra Grande, entre Ararendá e Ipueiras, mas tinha certeza de que me salvaria mais uma vez no “lift” da danada. Cheguei na altura do platô, mas só descia e não havia uma gota de vento. Fui descendo a serra na tentativa de bater em alguma termal perdida e nada. Acabei pousando numa roubada: um único roçado no meio da mata, próximo a um povoado. Andei uns 600m, peguei um mototaxi e fui para Ararendá, a 10km, para esperar o resgate. Total do vôo: 202km.
2º DIA DE PROVA. O teto fechado e ainda mais baixo. O primeiro pelotão saiu e eu decidi esperar um pouco mais para não arriscar tanto. Saí depois das 9h00 e quase pousei na Serra do Padre, quando praticamente decolei de novo, de uns 50m do chão. Pensei que estaria a salvo depois daquilo e não mais pousaria, mas para minha surpresa fui capturado por uma descendente que me obrigou a pousar em Custódio, percorrendo apenas 29km. No fim do dia, com exceção do trio da Sol, quase todos ficaram no caminho para Madalena.
3º DIA DE PROVA. O vento soprava forte e até o “Cecéu” desistiu de decolar. O show ficou por conta do Frank Brown que saiu, tomou um pau próximo à Pedra da Baleia e pousou em Madalena.
4º DIA DE PROVA. As 7h00 a rampa estava lotada e o vento moderado, mas muito frio e o teto fechado, com promessa de abrir ao longo da manhã. Esperei a galera sair e decolei às 8h00. Boiei por quase uma hora e finalmente me desconectei para o “cross”. A condição foi melhorando e passei alto sobre Monsenhor Tabosa (o terror dos voadores). Porém, próximo a Cruzeta (km 150), fui premiado com uma terrível descendente que quase me bota no chão. Fiquei a uns 100m de altura e decidi jogar exatamente no lugar aonde estaria ou a solução ou o problema: no rotor do único morrote à beira da pista de Cruzeta. Achei a danada e fui catapultado para a base da nuvem mais rápido do que desci. Neste momento, pensei: “se quase fiquei aqui, agora vou ter paciência e não quero mais ficar baixo, e já que estou só mesmo, vou dar umas entubadinhas de leve.” Subi até 3.500m durante o percurso até Pedro Segundo. No Piauí a condição é espetacular: teto alto, ar quente, bomba até escurecer e o paraca rende tudo. Enfim, a receita foi revelada para se voar 400 ou 500km e eu estava muito feliz de estar descobrindo isto na prática. Quando chegava em Piripiri, às 17h30, meu vário começou a apitar forte. Enrosquei e me mandei para Barras e, achando que facilitaria o resgate, decidir seguir a rodovia federal que rumava para Capitão de Campos. O problema é que a velocidade para Barras não era a mesma de vôo, o que não me fez render no final, já que poderia facilmente ter chegado aos 350km, e ainda fiquei novamente na roubada. O resgate demorou e quando chegou, lá pelas 23h00, eu havia dormido numa casinha à beira do asfalto, só conseguindo retornar à Quixadá dois dias depois. Fiquei triste pela situação, perderia um dia de prova e não ficaria bem colocado na competição. Mas para minha sorte, o vento resolveu este problema. Veio que veio e ninguém decolou mais. Os que se arriscaram, foram p´ro rotor da rampa e se arrependeram. Então retornei no sábado e fui entregar o GPS para a leitura dos vôos. O último vôo ficou em 324km. O resultado é que foram validadas três provas com um descarte. Eu fiquei com dois vôos bons, um de 324km e outro de 202km, o que me rendeu o terceiro lugar geral na competição. Ficam aqui os meus agradecimentos a todos que me apoiaram para mais esta participação no XCeará. E vou me empenhar fortemente para que o próximo XCeará seja nosso, com todos os méritos.
Valeu, galera!
Flávio Moreira.
1º DIA DE PROVA. A maioria na rampa por volta das 6h30 e eu ligado na turma da Sol, pois pretendia acompanhá-los ainda que fosse apenas no início do vôo. Decolei às 7h00 junto com a galera da frente. A saída neste horário é crítica pois o teto passa pouco dos 700m e não se pode entubar. Tentei permanecer no bolo até onde parecia vantagem e segurar voando até a condição melhorar. Quem não tomava muito cuidado caía antes da Serra do Padre ou não chegava a Custódio. Fui boiando já sem companhia desde Algodões até Madalena, quando a condição deu uma melhorada. No vôo parece que todos são suspeitos e ninguém segue ninguém, a não ser por uma boa termal de motivo. E segui tranqüilo, sem problemas ou colapsos, até ficar muito baixo, logo atrás da cidade de Monsenhor Tabosa. A uns 30m do chão, bem no pé do platô e com vento de proa e fraco, finalmente começou a bombar muito fraco, mas consegui garantir o “lift” da serrona. Novamente segui para a rota. A surpresa foi no quilômetro 200: entrei numa descendente enorme pouco antes da Serra Grande, entre Ararendá e Ipueiras, mas tinha certeza de que me salvaria mais uma vez no “lift” da danada. Cheguei na altura do platô, mas só descia e não havia uma gota de vento. Fui descendo a serra na tentativa de bater em alguma termal perdida e nada. Acabei pousando numa roubada: um único roçado no meio da mata, próximo a um povoado. Andei uns 600m, peguei um mototaxi e fui para Ararendá, a 10km, para esperar o resgate. Total do vôo: 202km.
2º DIA DE PROVA. O teto fechado e ainda mais baixo. O primeiro pelotão saiu e eu decidi esperar um pouco mais para não arriscar tanto. Saí depois das 9h00 e quase pousei na Serra do Padre, quando praticamente decolei de novo, de uns 50m do chão. Pensei que estaria a salvo depois daquilo e não mais pousaria, mas para minha surpresa fui capturado por uma descendente que me obrigou a pousar em Custódio, percorrendo apenas 29km. No fim do dia, com exceção do trio da Sol, quase todos ficaram no caminho para Madalena.
3º DIA DE PROVA. O vento soprava forte e até o “Cecéu” desistiu de decolar. O show ficou por conta do Frank Brown que saiu, tomou um pau próximo à Pedra da Baleia e pousou em Madalena.
4º DIA DE PROVA. As 7h00 a rampa estava lotada e o vento moderado, mas muito frio e o teto fechado, com promessa de abrir ao longo da manhã. Esperei a galera sair e decolei às 8h00. Boiei por quase uma hora e finalmente me desconectei para o “cross”. A condição foi melhorando e passei alto sobre Monsenhor Tabosa (o terror dos voadores). Porém, próximo a Cruzeta (km 150), fui premiado com uma terrível descendente que quase me bota no chão. Fiquei a uns 100m de altura e decidi jogar exatamente no lugar aonde estaria ou a solução ou o problema: no rotor do único morrote à beira da pista de Cruzeta. Achei a danada e fui catapultado para a base da nuvem mais rápido do que desci. Neste momento, pensei: “se quase fiquei aqui, agora vou ter paciência e não quero mais ficar baixo, e já que estou só mesmo, vou dar umas entubadinhas de leve.” Subi até 3.500m durante o percurso até Pedro Segundo. No Piauí a condição é espetacular: teto alto, ar quente, bomba até escurecer e o paraca rende tudo. Enfim, a receita foi revelada para se voar 400 ou 500km e eu estava muito feliz de estar descobrindo isto na prática. Quando chegava em Piripiri, às 17h30, meu vário começou a apitar forte. Enrosquei e me mandei para Barras e, achando que facilitaria o resgate, decidir seguir a rodovia federal que rumava para Capitão de Campos. O problema é que a velocidade para Barras não era a mesma de vôo, o que não me fez render no final, já que poderia facilmente ter chegado aos 350km, e ainda fiquei novamente na roubada. O resgate demorou e quando chegou, lá pelas 23h00, eu havia dormido numa casinha à beira do asfalto, só conseguindo retornar à Quixadá dois dias depois. Fiquei triste pela situação, perderia um dia de prova e não ficaria bem colocado na competição. Mas para minha sorte, o vento resolveu este problema. Veio que veio e ninguém decolou mais. Os que se arriscaram, foram p´ro rotor da rampa e se arrependeram. Então retornei no sábado e fui entregar o GPS para a leitura dos vôos. O último vôo ficou em 324km. O resultado é que foram validadas três provas com um descarte. Eu fiquei com dois vôos bons, um de 324km e outro de 202km, o que me rendeu o terceiro lugar geral na competição. Ficam aqui os meus agradecimentos a todos que me apoiaram para mais esta participação no XCeará. E vou me empenhar fortemente para que o próximo XCeará seja nosso, com todos os méritos.
Valeu, galera!
Flávio Moreira.
Saturday, December 08, 2007
Tuesday, December 04, 2007
Voo de 300 Kms no X-Ceará 2007 por Gonçalo Velez
Adoro participar no XCeará e espero conseguir ser um reincidente em cada ano!
Nesta prova voa-se em liberdade, o quanto se quer e para onde se quer, sem regras, sem limitações. Deve-se respeitar um eixo e voar-se em distância o mais longe que consigamos. Esse eixo deve ser preferencialmente a rota do vento que nos impele à sua velocidade.
Este ano os horários de descolagem adiantaram. O pequeno almoço passou para as 6h30 e o primeiro transporte para a descolagem às 7h!
Quase todos os pilotos partiam muito cedo para a descolagem. Procurei isolar-me dessa ânsia pois o que procurava era realizar um bom voo e não julgar que podia estabelecer algum recorde!
Descolar às 8h ou mesmo às 8h30 significava encontrar condições muito fracas, um tecto baixo e enfrentar um risco grande de não se ultrapassarem 20 km.
Subir à rampa demasiado cedo, para descolar horas depois implicava um desgaste muito grande pois a espera ao vento é enervante. Assim, subia cerca das 7h30-8h pois não fazia tenção de descolar antes das 9h.
Não sei por quê, achei as descolagens este ano mais fáceis. Talvez por ter levado uma asa mais rápida (Tycoon, dhv 2-3) do que a que usei nos anos anteriores em Quixadá (Tattoo, dhv 2). Além da maior velocidade em voo, esta asa infla e sobe com maior rapidez.
Carrego-a com 2 kg acima do limite superior.
São vários factores que melhoram a segurança nestas condições agressivas de Quixadá.
Quixadá, 15.11.07
Descolei às 9h10. A essa hora o tecto ainda era baixo, 1200m, e a minha intenção era seguir uma táctica de prudência: enrolar toda a ascendente que encontrasse.
Nestes ventos de 30-40 kmh de média, viajamos na deriva das térmicas que também se deslocam perto dessa velocidade.
Pouco depois de descolar fiquei baixo, km 15, e tive o sentimento de angústia do costume, de me sentir impotente para inverter um destino terrível, mas não desisti, claro. Esta era a zona da "marreca" geral.
Como já estava com algum treino naquelas condições, era o meu 6º voo em Quixadá este ano, fiz uma deriva na diagonal meio a contravento e, por sorte, entre dois montes pequenos que, provavelmente faziam acelerar o ar, soltou-se a térmica!
Consegui subir aos 1500m percorrendo vários quilómetros que me levaram para a planície de Madalena, deixando para trás os montes que envolvem Quixadá.
São os primeiros 60 km os mais críticos. A maioria dos pilotos aterra antes de Madalena por que o tecto ainda é baixo, as térmicas não são muito fortes e o relevo é um pouco incompreensível. No plano a oeste de Quixadá, voa-se frequentemente no “azul”.
No entanto, neste dia o céu estava bem populado de cúmulos.
Depois desta térmica fiz uma boa transição mas os cúmulos que tinha visado tinham esgotado a energia. Naquela zona há vários lagos e lembrei-me de o Diogo dizer que os lagos libertam sempre térmica.
Sobrevoei um lago pequeno onde tinha aterrado há dias, pensando que seria muito azar voltar a aterrar ali.
Dirigi-me para sotavento do maior lago, onde já tinha subido noutras ocasiões, e sondei o espaço, nada. Estranho.
Vou perdendo altitude e desaperto a abertura da selette pois quero estar mais concentrado no voo. Deixo-me ir para sotavento sentindo ansiedade mas acreditando que não ficaria naquele local.
De repente, sinto-a! Formava um cúmulo, e interpretei que a térmica viajaria deitada perto do chão por cerca de 1 km e depois levantava.
Uff que alívio!
Os momentos mais memoráveis do voo de distância são estas recuperações inesperadas, sobretudo quando já se olha em redor para ver quais são as possibilidades de aterragem!
Este ano apliquei pela primeira vez com sucesso a técnica de sondar o espaço.
Em voos anteriores o meu hábito quando perdia a térmica, era virar costas ao vento e “deixar-me ir que algo haveria de aparecer”.
Errado. É preferível redescobrir algo que existe (ou já existiu) do que partir para a incerteza. Neste caso, socorria-me dos instrumentos e do “esperto na cabeça” para tentar perceber que podia já estar a voar a sotavento da térmica, ou ao lado.
Muitas térmicas sofriam muito com a deriva do vento e desenvolviam-se muito “deitadas”. Senti que dominava melhor os nervos, que estava um piloto mais maduro, e senti que sofria muito menos com aquela impaciência de “voar sem ver” e o stress que isso provoca.
Voamos num meio transparente, que dá alguns indícios para quem os consiga detectar, mas se estivermos numa fase da nossa progressão em que não sabemos o que fazer, isso é muito enervante! Vamos para o chão sem sabermos porquê, nem o que poderíamos ter feito para o evitar.
Esta térmica levou-me até Madalena, km 60, numa rota a sul por onde nunca tinha passado. Aqui havia uma extensão muito grande de jurema, o mato com espinhos, que me deixou preocupado. Nesta fase perdi muita altitude pois não conseguia urinar através da minha algália.
Já há algum tempo que me esforçava, mas sem resultado. A minha preocupação era: ou mijava ou aterrava, pois o meu limite são as 3h-3h30 de voo.
Decidi que tinha de voar! Tirei a luva, abri a selette, depois as calças, arranquei o tubo, esforcei-me e… “aqui vai disto, ó Evaristo!”
Nem vi o que aconteceu por causa do cockpit à frente, mas penso que mais de metade da urina me molhou as calças e o interior da selette.
Não fez mal, ganhara outro ânimo para voar!
Depois consegui outra térmica que me fez sobrevoar toda a serra de Monsenhor Tabosa e passar à vista dos locais onde já tinha aterrado duas vezes, uma delas dois dias antes. Só que desta vez passava alto e cedo, 15h. Partilhei esta térmica com um urubu e girávamos observando-nos mutuamente, ambos com o pescoço dobrado para o lado. Respeitámo-nos sempre até ao instante em que decidi dar uma volta no sentido contrário e estraguei a nossa “relação”, levando-o a abandonar a térmica.
Em Tabosa, km 120, subi numa ascendente gerada por uma queimada e a térmica era suave, pouco rentável, mas segura.
Passei a serra de Tabosa pelo norte, por cima da estrada, e consegui nova térmica resultante doutra queimada que me levou aos 2800m.
A estrada no chão era uma longa recta para Nova Russas, e por cima tinha uma bela estrada de cúmulos.
Não sei porquê, este ano evitei entrar na nuvem… Voei bastante de acelerador sob as nuvens pois sugavam bastante, e também por ver ao longe o que pareciam congestus!
Passei o km 127 a pensar que tinha ultrapassado a minha melhor marca realizada este ano a partir de Castelo de Vide.
Foi neste troço, km 140, que sofri dois potentes frontais que me deixaram muito desconfortável, sobretudo por terem sido quase consecutivos. Estava na base do cúmulo e sentia-se uma turbulência muito agressiva e uma ascendente tipo sugadouro, algo preocupante.
Cometi o erro de abandonar a térmica para sotavento e de entrar em fortes descendentes.
A seguir a Nova Russas, km 160, tornei a ver-me a 300m do chão e a avaliar terrenos de aterragens. Mas nova térmica me salvou e levou-me para 2600m.
Adiante acontece algo de curioso: o chão sobe, dando origem a um planalto, e ficamos com um tecto mais estreito! Essa é a impressão que dá, mas o tecto também vai subindo.
Olho em redor e dou-me que conta de que não vi uma única asa durante todo o voo! Que se passa? Que é feito “deles”? Como se fala sempre demasiado no rádio, voo com ele desligado.
A organização pedia que informássemos a nossa posição sempre que aproximávamos uma baliza: número de piloto, altitude e distância da baliza.
Esta informação é importante por razões de segurança óbvias, mas também para permitir à organização posicionar veículos de transporte.
Passo Poranga, km 215, bastante alto, consigo atingir 2900m e percorro 26 km em planeio a direito. Em baixo a estrada é uma longa recta de terra com mato para cada lado. Uma zona muito preocupante se tivesse que aterrar, embora a estrada fosse sempre a salvação.
Às 16h30, km 255, consigo subir no que julguei ser a última térmica, que me levou aos 2900m outra vez.
Faço um planeio de uns 28 km numa restituição deliciosa em que a taxa de queda é muito reduzida, e as cores do final de tarde são soberbas.
Concentrei-me a aproveitar ao máximo as modestas linhas de ascendente que fui sentindo. Às vezes desconcentrava-me a apreciar a paisagem e auto-criticava-me!
Cheguei a Pedro II eram 17h e reparo que estou no km 283.
Pergunto-me: e por que não os 300 km, hein?!
Passo a sul da cidade sobre uma colina e vejo adiante um urubu que enrolava térmica. Nem queria acreditar que ainda podia haver uma ascendente aquela hora!
Era fraca mas fez-me subir 700m. O urubu e eu girávamos sincronizados, eu desconfiado, tentava olhar para trás das costas para ver se ele não me traía.
Depois subi mais do que ele e desistiu, indo ao encontro de um melhor “amigo”.
Sabia que estava próximo o momento de aterrar e fazia contas ao terreno, e sobretudo tentava adivinhar qual era a estrada principal, ou seja, o eixo lógico dos transportes de recolha para não ficar muito distante de um local conveniente.
Do ar tudo parece perto e fácil, mas quando estamos aterrados arrependemo-nos de algumas opções de aterragem que fizemos, sobretudo quando o rádio não alcança alguém!
Contudo, neste momento só olhava para o conta quilómetros: queria passar os 300 km!
Voei por cima de uma estrada e esperei, tentando sempre sentir as melhores linhas de planeio.
Aproximava uma aldeia e vi 288 km.
Lá em baixo jogavam futebol num campo grande. Em redor era arvoredo e raras clareiras.
Detectei um campo largo, bom para aterrar, e outro campo mais longe, menos bom, estreito e ladeado de árvores.
Vi 299 km e deixei-me ir… esperei.
Mal vi os 300 km dei meia volta e dirigi-me para esse campo largo.
Uff, consegui.
Eram 17h30. Não tinha comido todo o dia e antes de dobrar a asa comi duas deliciosas maçãs e três mini-bananas que transportava comigo.
O meu rádio não tinha alcance e o meu telefone não tinha rede! Pedi a um dos nativos para enviar um sms ao Chico com as minhas coordenadas.
Fez-se escuro rapidamente e saí do campo na companhia de aldeãos com uma lanterna acesa na testa.
Deram-me boleia de moto até uma mercearia no centro da aldeia onde comprei cerveja, pão e uma lata de sardinhas, pouco mais havia para comer.
Soube que estava em Mororó, município de Lagoa de São Francisco, estado do Piauí.
Fecharam a mercearia às 20h e deitei-me a dormir no chão com uma bota a servir-me de almofada, o rádio ligado à cabeceira.
O carro da recolha apanhou-me eram 1h30 e cheguei ao hotel em Quixadá às 9h, atrasado para o pequeno almoço e para outro dia de voo!
Conclusão
Este XCeará resultou numa enorme surpresa para mim pois acabei por voar o triplo do que voei em 2006!
Em 8 dias disponíveis, voei 7, num total de 18.9h.
Excluíndo o voo local de treino no primeiro sábado, voei 17.8h e 587 km de distância.
Isto equivale às médias por voo de 2h58 e de 98 km de distância.
Foi uma excelente semana!
Obrigado aos meus companheiros de viagem e de voo, Paulo Reis, Carlos Brasuka, Gil Navalho e João Brito pela amizade, e aos demais participantes, motoristas das recolhas, meninos de Juatama (os ajudas na descolagem) e pessoal da organização.
Parabéns aos recordistas do Mundo, Marcelo Prieto “Cecéu”, Rafael Saladini “Sardinha” e Frank Brown pelos 461.8 km voados em 14.11.07, a véspera do dia do voo que relato acima.
Gonçalo Velez
Nesta prova voa-se em liberdade, o quanto se quer e para onde se quer, sem regras, sem limitações. Deve-se respeitar um eixo e voar-se em distância o mais longe que consigamos. Esse eixo deve ser preferencialmente a rota do vento que nos impele à sua velocidade.
Este ano os horários de descolagem adiantaram. O pequeno almoço passou para as 6h30 e o primeiro transporte para a descolagem às 7h!
Quase todos os pilotos partiam muito cedo para a descolagem. Procurei isolar-me dessa ânsia pois o que procurava era realizar um bom voo e não julgar que podia estabelecer algum recorde!
Descolar às 8h ou mesmo às 8h30 significava encontrar condições muito fracas, um tecto baixo e enfrentar um risco grande de não se ultrapassarem 20 km.
Subir à rampa demasiado cedo, para descolar horas depois implicava um desgaste muito grande pois a espera ao vento é enervante. Assim, subia cerca das 7h30-8h pois não fazia tenção de descolar antes das 9h.
Não sei por quê, achei as descolagens este ano mais fáceis. Talvez por ter levado uma asa mais rápida (Tycoon, dhv 2-3) do que a que usei nos anos anteriores em Quixadá (Tattoo, dhv 2). Além da maior velocidade em voo, esta asa infla e sobe com maior rapidez.
Carrego-a com 2 kg acima do limite superior.
São vários factores que melhoram a segurança nestas condições agressivas de Quixadá.
Quixadá, 15.11.07
Descolei às 9h10. A essa hora o tecto ainda era baixo, 1200m, e a minha intenção era seguir uma táctica de prudência: enrolar toda a ascendente que encontrasse.
Nestes ventos de 30-40 kmh de média, viajamos na deriva das térmicas que também se deslocam perto dessa velocidade.
Pouco depois de descolar fiquei baixo, km 15, e tive o sentimento de angústia do costume, de me sentir impotente para inverter um destino terrível, mas não desisti, claro. Esta era a zona da "marreca" geral.
Como já estava com algum treino naquelas condições, era o meu 6º voo em Quixadá este ano, fiz uma deriva na diagonal meio a contravento e, por sorte, entre dois montes pequenos que, provavelmente faziam acelerar o ar, soltou-se a térmica!
Consegui subir aos 1500m percorrendo vários quilómetros que me levaram para a planície de Madalena, deixando para trás os montes que envolvem Quixadá.
São os primeiros 60 km os mais críticos. A maioria dos pilotos aterra antes de Madalena por que o tecto ainda é baixo, as térmicas não são muito fortes e o relevo é um pouco incompreensível. No plano a oeste de Quixadá, voa-se frequentemente no “azul”.
No entanto, neste dia o céu estava bem populado de cúmulos.
Depois desta térmica fiz uma boa transição mas os cúmulos que tinha visado tinham esgotado a energia. Naquela zona há vários lagos e lembrei-me de o Diogo dizer que os lagos libertam sempre térmica.
Sobrevoei um lago pequeno onde tinha aterrado há dias, pensando que seria muito azar voltar a aterrar ali.
Dirigi-me para sotavento do maior lago, onde já tinha subido noutras ocasiões, e sondei o espaço, nada. Estranho.
Vou perdendo altitude e desaperto a abertura da selette pois quero estar mais concentrado no voo. Deixo-me ir para sotavento sentindo ansiedade mas acreditando que não ficaria naquele local.
De repente, sinto-a! Formava um cúmulo, e interpretei que a térmica viajaria deitada perto do chão por cerca de 1 km e depois levantava.
Uff que alívio!
Os momentos mais memoráveis do voo de distância são estas recuperações inesperadas, sobretudo quando já se olha em redor para ver quais são as possibilidades de aterragem!
Este ano apliquei pela primeira vez com sucesso a técnica de sondar o espaço.
Em voos anteriores o meu hábito quando perdia a térmica, era virar costas ao vento e “deixar-me ir que algo haveria de aparecer”.
Errado. É preferível redescobrir algo que existe (ou já existiu) do que partir para a incerteza. Neste caso, socorria-me dos instrumentos e do “esperto na cabeça” para tentar perceber que podia já estar a voar a sotavento da térmica, ou ao lado.
Muitas térmicas sofriam muito com a deriva do vento e desenvolviam-se muito “deitadas”. Senti que dominava melhor os nervos, que estava um piloto mais maduro, e senti que sofria muito menos com aquela impaciência de “voar sem ver” e o stress que isso provoca.
Voamos num meio transparente, que dá alguns indícios para quem os consiga detectar, mas se estivermos numa fase da nossa progressão em que não sabemos o que fazer, isso é muito enervante! Vamos para o chão sem sabermos porquê, nem o que poderíamos ter feito para o evitar.
Esta térmica levou-me até Madalena, km 60, numa rota a sul por onde nunca tinha passado. Aqui havia uma extensão muito grande de jurema, o mato com espinhos, que me deixou preocupado. Nesta fase perdi muita altitude pois não conseguia urinar através da minha algália.
Já há algum tempo que me esforçava, mas sem resultado. A minha preocupação era: ou mijava ou aterrava, pois o meu limite são as 3h-3h30 de voo.
Decidi que tinha de voar! Tirei a luva, abri a selette, depois as calças, arranquei o tubo, esforcei-me e… “aqui vai disto, ó Evaristo!”
Nem vi o que aconteceu por causa do cockpit à frente, mas penso que mais de metade da urina me molhou as calças e o interior da selette.
Não fez mal, ganhara outro ânimo para voar!
Depois consegui outra térmica que me fez sobrevoar toda a serra de Monsenhor Tabosa e passar à vista dos locais onde já tinha aterrado duas vezes, uma delas dois dias antes. Só que desta vez passava alto e cedo, 15h. Partilhei esta térmica com um urubu e girávamos observando-nos mutuamente, ambos com o pescoço dobrado para o lado. Respeitámo-nos sempre até ao instante em que decidi dar uma volta no sentido contrário e estraguei a nossa “relação”, levando-o a abandonar a térmica.
Em Tabosa, km 120, subi numa ascendente gerada por uma queimada e a térmica era suave, pouco rentável, mas segura.
Passei a serra de Tabosa pelo norte, por cima da estrada, e consegui nova térmica resultante doutra queimada que me levou aos 2800m.
A estrada no chão era uma longa recta para Nova Russas, e por cima tinha uma bela estrada de cúmulos.
Não sei porquê, este ano evitei entrar na nuvem… Voei bastante de acelerador sob as nuvens pois sugavam bastante, e também por ver ao longe o que pareciam congestus!
Passei o km 127 a pensar que tinha ultrapassado a minha melhor marca realizada este ano a partir de Castelo de Vide.
Foi neste troço, km 140, que sofri dois potentes frontais que me deixaram muito desconfortável, sobretudo por terem sido quase consecutivos. Estava na base do cúmulo e sentia-se uma turbulência muito agressiva e uma ascendente tipo sugadouro, algo preocupante.
Cometi o erro de abandonar a térmica para sotavento e de entrar em fortes descendentes.
A seguir a Nova Russas, km 160, tornei a ver-me a 300m do chão e a avaliar terrenos de aterragens. Mas nova térmica me salvou e levou-me para 2600m.
Adiante acontece algo de curioso: o chão sobe, dando origem a um planalto, e ficamos com um tecto mais estreito! Essa é a impressão que dá, mas o tecto também vai subindo.
Olho em redor e dou-me que conta de que não vi uma única asa durante todo o voo! Que se passa? Que é feito “deles”? Como se fala sempre demasiado no rádio, voo com ele desligado.
A organização pedia que informássemos a nossa posição sempre que aproximávamos uma baliza: número de piloto, altitude e distância da baliza.
Esta informação é importante por razões de segurança óbvias, mas também para permitir à organização posicionar veículos de transporte.
Passo Poranga, km 215, bastante alto, consigo atingir 2900m e percorro 26 km em planeio a direito. Em baixo a estrada é uma longa recta de terra com mato para cada lado. Uma zona muito preocupante se tivesse que aterrar, embora a estrada fosse sempre a salvação.
Às 16h30, km 255, consigo subir no que julguei ser a última térmica, que me levou aos 2900m outra vez.
Faço um planeio de uns 28 km numa restituição deliciosa em que a taxa de queda é muito reduzida, e as cores do final de tarde são soberbas.
Concentrei-me a aproveitar ao máximo as modestas linhas de ascendente que fui sentindo. Às vezes desconcentrava-me a apreciar a paisagem e auto-criticava-me!
Cheguei a Pedro II eram 17h e reparo que estou no km 283.
Pergunto-me: e por que não os 300 km, hein?!
Passo a sul da cidade sobre uma colina e vejo adiante um urubu que enrolava térmica. Nem queria acreditar que ainda podia haver uma ascendente aquela hora!
Era fraca mas fez-me subir 700m. O urubu e eu girávamos sincronizados, eu desconfiado, tentava olhar para trás das costas para ver se ele não me traía.
Depois subi mais do que ele e desistiu, indo ao encontro de um melhor “amigo”.
Sabia que estava próximo o momento de aterrar e fazia contas ao terreno, e sobretudo tentava adivinhar qual era a estrada principal, ou seja, o eixo lógico dos transportes de recolha para não ficar muito distante de um local conveniente.
Do ar tudo parece perto e fácil, mas quando estamos aterrados arrependemo-nos de algumas opções de aterragem que fizemos, sobretudo quando o rádio não alcança alguém!
Contudo, neste momento só olhava para o conta quilómetros: queria passar os 300 km!
Voei por cima de uma estrada e esperei, tentando sempre sentir as melhores linhas de planeio.
Aproximava uma aldeia e vi 288 km.
Lá em baixo jogavam futebol num campo grande. Em redor era arvoredo e raras clareiras.
Detectei um campo largo, bom para aterrar, e outro campo mais longe, menos bom, estreito e ladeado de árvores.
Vi 299 km e deixei-me ir… esperei.
Mal vi os 300 km dei meia volta e dirigi-me para esse campo largo.
Uff, consegui.
Eram 17h30. Não tinha comido todo o dia e antes de dobrar a asa comi duas deliciosas maçãs e três mini-bananas que transportava comigo.
O meu rádio não tinha alcance e o meu telefone não tinha rede! Pedi a um dos nativos para enviar um sms ao Chico com as minhas coordenadas.
Fez-se escuro rapidamente e saí do campo na companhia de aldeãos com uma lanterna acesa na testa.
Deram-me boleia de moto até uma mercearia no centro da aldeia onde comprei cerveja, pão e uma lata de sardinhas, pouco mais havia para comer.
Soube que estava em Mororó, município de Lagoa de São Francisco, estado do Piauí.
Fecharam a mercearia às 20h e deitei-me a dormir no chão com uma bota a servir-me de almofada, o rádio ligado à cabeceira.
O carro da recolha apanhou-me eram 1h30 e cheguei ao hotel em Quixadá às 9h, atrasado para o pequeno almoço e para outro dia de voo!
Conclusão
Este XCeará resultou numa enorme surpresa para mim pois acabei por voar o triplo do que voei em 2006!
Em 8 dias disponíveis, voei 7, num total de 18.9h.
Excluíndo o voo local de treino no primeiro sábado, voei 17.8h e 587 km de distância.
Isto equivale às médias por voo de 2h58 e de 98 km de distância.
Foi uma excelente semana!
Obrigado aos meus companheiros de viagem e de voo, Paulo Reis, Carlos Brasuka, Gil Navalho e João Brito pela amizade, e aos demais participantes, motoristas das recolhas, meninos de Juatama (os ajudas na descolagem) e pessoal da organização.
Parabéns aos recordistas do Mundo, Marcelo Prieto “Cecéu”, Rafael Saladini “Sardinha” e Frank Brown pelos 461.8 km voados em 14.11.07, a véspera do dia do voo que relato acima.
Gonçalo Velez
Balanço pessoal sobre o X-Ceará 2007
Tive o privilégio de poder participar no X-Ceará pela segunda vez consecutiva. Preparei-me durante um ano inteiro apenas com o intuito de estar fisicamente apto para o desafio de participar neste evento. As competições em que participei, os voos de Cross Country que fiz e as muitas horas de preparação física tinham como objectivo estar apto e forte para voar em Quixadá e fazer os melhores voo possíveis.
Uma vez mais e pela segunda vez consecutiva as coisas não correram como sonhara, mas sinto-me feliz e realizado na mesma! Os resultados (em termos de distâncias alcançadas) foram inferiores aos do ano anterior. Voei bastante, mas não fui longe! Simplesmente não me senti mentalmente preparado para ter feito melhores voos do que aqueles que fiz e que guardo como inesquecíveis na mesma.
Não interessa estar apenas fisicamente preparado, quando a mente não sente o desejo de ir mais longe. Todos os meus voos de distância no passado, sempre estiveram relacionados com uma vontade muito grande de querer estar naqueles locais, sonhar com a forma de os realizar, estudar as rotas possíveis, etc... Ao descolar para esses voos tudo acabou por acontecer naturalmente. Desta vez, não quis o suficiente, não me preparei mentalmente e deixei-me distrair por outro tipo de prazeres.
Em Quixadá tudo acontece de uma forma diferente e é preciso querer muito mantermo-nos no ar para conseguirmos ir mais longe. Apenas os persistentes e determinados conseguem alcançar as grandes marcas e eu não fui (uma vez mais) um desses e não fiquei nada decepcionado por isso.
Acho que o facto de estar a participar num evento que me apaixona e que considero um desafio pessoal, no local do mundo onde mais adoro voar, numa paisagem que me fascina, com condições tão adversas e até por vezes perigosas fazem-me vacilar um pouco e levam-me a tomar decisões precipitadas e pouco lógicas. Sei exactamente o que preciso de fazer para voar mais e melhor, mas não consigo encontrar um meio-termo entre voar conservadoramente e arriscar em demasia. Os meus voos em Quixadá têm sido o reflexo da minha atitude em relação à minha vida pouco equilibrada dos últimos tempos (do tipo 8 ou 80) ... Quando não consigo encontrar equilíbrio no que faço, não posso esperar mais do que aquilo que obtive e encaro tudo como mais uma experiência gratificante.
Sinto uma enorme satisfação por ter podido estar uma vez mais presente e de ter tido a oportunidade de rever alguns amigos voadores do mundo inteiro. Aprendi um pouco mais sobre este tipo de voo peculiar e adorei ter descolado com os novos recordistas mundiais e acompanhá-los nas primeiras térmicas no dia do recorde mundial. Adorei testemunhar os feitos do Gonçalo Velez e do Gil Navalho que fizeram voos acima dos 300 kms! Adorei a companhia do Carlos Brazuka e do João Brito e tive um enorme prazer de captar isto tudo em imagens que me fazem sonhar.
Quer me bem parecer que em 2008 vamos estar todos lá outra vez!
Aproveitei alguns dias para aprender KiteSurf em Combuco. Já consigo aguentar-me em pé na prancha e o controle do Kite foi fácil e rápido. Estou em vias de continuar a ter mais algumas aulas (logo que o tempo o permita) para aperfeiçoar a técnica ...
Paulo Reis
Uma vez mais e pela segunda vez consecutiva as coisas não correram como sonhara, mas sinto-me feliz e realizado na mesma! Os resultados (em termos de distâncias alcançadas) foram inferiores aos do ano anterior. Voei bastante, mas não fui longe! Simplesmente não me senti mentalmente preparado para ter feito melhores voos do que aqueles que fiz e que guardo como inesquecíveis na mesma.
Não interessa estar apenas fisicamente preparado, quando a mente não sente o desejo de ir mais longe. Todos os meus voos de distância no passado, sempre estiveram relacionados com uma vontade muito grande de querer estar naqueles locais, sonhar com a forma de os realizar, estudar as rotas possíveis, etc... Ao descolar para esses voos tudo acabou por acontecer naturalmente. Desta vez, não quis o suficiente, não me preparei mentalmente e deixei-me distrair por outro tipo de prazeres.
Em Quixadá tudo acontece de uma forma diferente e é preciso querer muito mantermo-nos no ar para conseguirmos ir mais longe. Apenas os persistentes e determinados conseguem alcançar as grandes marcas e eu não fui (uma vez mais) um desses e não fiquei nada decepcionado por isso.
Acho que o facto de estar a participar num evento que me apaixona e que considero um desafio pessoal, no local do mundo onde mais adoro voar, numa paisagem que me fascina, com condições tão adversas e até por vezes perigosas fazem-me vacilar um pouco e levam-me a tomar decisões precipitadas e pouco lógicas. Sei exactamente o que preciso de fazer para voar mais e melhor, mas não consigo encontrar um meio-termo entre voar conservadoramente e arriscar em demasia. Os meus voos em Quixadá têm sido o reflexo da minha atitude em relação à minha vida pouco equilibrada dos últimos tempos (do tipo 8 ou 80) ... Quando não consigo encontrar equilíbrio no que faço, não posso esperar mais do que aquilo que obtive e encaro tudo como mais uma experiência gratificante.
Sinto uma enorme satisfação por ter podido estar uma vez mais presente e de ter tido a oportunidade de rever alguns amigos voadores do mundo inteiro. Aprendi um pouco mais sobre este tipo de voo peculiar e adorei ter descolado com os novos recordistas mundiais e acompanhá-los nas primeiras térmicas no dia do recorde mundial. Adorei testemunhar os feitos do Gonçalo Velez e do Gil Navalho que fizeram voos acima dos 300 kms! Adorei a companhia do Carlos Brazuka e do João Brito e tive um enorme prazer de captar isto tudo em imagens que me fazem sonhar.
Quer me bem parecer que em 2008 vamos estar todos lá outra vez!
Aproveitei alguns dias para aprender KiteSurf em Combuco. Já consigo aguentar-me em pé na prancha e o controle do Kite foi fácil e rápido. Estou em vias de continuar a ter mais algumas aulas (logo que o tempo o permita) para aperfeiçoar a técnica ...
Paulo Reis
Friday, November 30, 2007
X-Ceará 2007 - Videos e Reportagens
X-Ceará 2007 - KiteSurf em Combuco
X-Ceara 2007 - Tugas em Fortaleza
X-Ceara 2007 - Viagem para Quixada e Voozinho
X-Ceara 2007 - Briefing e Manga de Teste
X-Ceara 2007 - Dias 1, 2 e 3
X-Ceara 2007 - Dias 4 e 5
X-Ceara 2007 - Dia 6 e Entrega de Premios
X-Ceara 2007 - Joatama TV
X-Ceara 2007 - Entrevista a Thalys
X-Ceara 2007 - Entrevista a Flavinha
X-Ceara 2007 - Entrevistas Diversas
X-Ceara 2007 - Entrevista a Rafael Saladini
X-Ceara 2007 - Entrevista a Marcelo Prieto
X-Ceara 2007 - Entrevista a Frank Brown
Sunday, November 25, 2007
Saturday, November 24, 2007
Relato do Recorde Mundial - 461,8km por Rafael Saladini
14/11/2007
Recorde Mundial - 461,8Km
Tracklog - Marcelo Prieto
Tracklog - Rafael Saladini
Tracklog - Frank Brown
Hoje completamos 31 dias no sertão nordestino e a cada dia que passa o recorde mundial parece mais distante. Os ânimos já estão completamente abalados, a pressão de ter passado tanto tempo em busca de um objetivo já há muito tempo pesa em nossos ombros, e não resta mais muita motivação e nem muitos dias. A situação atual também não é das mais confortáveis, pois durante o XCeará muitos pilotos começaram a copiar nossa estratégia de decolar bem cedo e sobreviver durante a manhã, o que nos pressionou psicologicamente ainda mais. Afinal não seria justo após tantas tentativas e tanto estudo do local, chegar um estrangeiro e quebrar a marca de 423 km. Seria um desastre. O mais importante naquele momento era tentar abstrair toda a pressão e confiar em nossa própria capacidade.
Meu vício de abrir a cortina do quarto para checar a condição pela manhã não existe mais. Prefiro não mais ter opinião sobre o dia antes de chegar a Monsenhor Tabosa voando. Mas logo na subida da rampa, já havia uma densa camada de umidade em médias camadas da atmosfera desanimando muito os pilotos. Alguns pilotos até riram quando colocamos a vela em posição de decolagem, o cenário indicava um prego logo atrás da rampa em Custódio.
Havíamos combinado em voarmos juntos para acelerar a velocidade média até o fim do dia. A dúvida era saber se isso seria possível, afinal voar dez horas completamente juntos no mesmo ritmo seria extremamente difícil. Decolamos as 7:20h completamente desacreditados pelos que nos observavam. Alguns outros pilotos corajosos decolaram no mesmo horário.
Logo na saída o plano de voarmos juntos já não funcionou. Nos separamos na primeira térmica e acabei saindo da rampa em companhia de Francisco Ceará e André Modelo, enquanto Frank e Cecéu resolveram esperar mais alguns minutos. Minha saída foi desastrosa, minha segunda térmica praticamente não existiu, eu acabei me separando de todo mundo e fui para uma altura crítica próximo a serra do padre (km 15). Cheguei a 150 metros de altura embaixo de uma região completamente sombreada, eram quase 8:00h e minha situação não era nada confortável. Com muito custo consegui encontrar uma maneira de sobreviver e voltar para o vôo.
Cecéu e Frank saíram um pouco atrás também em situação complicada, cruzando uma extensa região úmida e muito sombreada. Conseguiram sobreviver se arrastando pelos monólitos daquele inicio de vôo. Enquanto isso, André e Ceará deslocavam-se por uma rota um pouco mais a direita e já engatavam numa condição muito bem formada, colocando uns bons 10 km a nossa frente. Minha ansiedade era grande, mas ainda restavam mais de 9 horas de vôo.
Quando avistei Frank e Cecéu juntos há cinco quilômetros de mim, pensei que poderíamos facilmente conectar em pouco tempo. Errado. Como era muito cedo e os ciclos ainda estavam bem curtos, não consegui me manter no mesmo lugar e fui obrigado a continuar adiante sozinho até que eventualmente eles pudessem me alcançar para juntarmos o grupo.
Antes de Madalena chegamos a ficar bem próximos, mas como minha linha de térmicas estava funcionando bem melhor, acabei me adiantando ainda mais em relação a eles. Frank e Cecéu escolheram uma linha complicada, que os manteve o tempo inteiro com a corda no pescoço até o platô de Monsenhor Tabosa. O resumo desse inicio de vôo era um cenário complicado, com nuvens estratificadas em camadas médias da atmosfera filtrando muito o sol já fraco da manhã, o grupo desmantelado com Cecéu e Frank juntos não conseguindo se deslocar satisfatoriamente para me alcançar, eu totalmente sozinho a frente com um medo enorme de cair, André e Ceará com 10km de vantagem e a total certeza de que se sobrevivêssemos a manhã, facilmente chegaríamos nos 400kms. Mas nós tínhamos um problema, uma dupla de pilotos extremamente competentes e capazes, voando juntos a nossa frente. Isso significava que estávamos atrasados.
Minha ansiedade em conseguir me aproximar da dupla era tão grande quanto a minha ansiedade em conectar com Cecéu e Frank. Resolvi acima de tudo controlar minha ansiedade e mentalizar sobre a minha real situação. Correr sozinho não adiantaria nada e seria assumir um risco muito grande para a hora. E mesmo que conectasse com André e Ceará, pilotos antigos e experientes, acredito que sozinho não teria condições de influenciar nas decisões deles. Minha idéia era atrasá-los ao máximo para dar tempo ao Cecéu e Frank de me pegarem. Optei por confiar na capacidade do nosso trio para pegá-los mais tarde. Decisão conservadora que talvez tenha sido importantíssima para ajudar o grupo.
Assim que pulei para o platô de Monsenhor Tabosa, voando burocraticamente consegui dar tempo para que meus companheiros se juntassem a mim. Fiquei enrolando numa bolha fraca para delinear a linha de perturbação para que eles tivessem mais segurança em pular mais rápido e mais baixo. Funcionou. Estávamos no km 110 e finalmente conectamos o time. Um recorde mundial estava sendo construído naquele momento.
André e Ceará cruzaram a serra de Tabosa e rapidamente entravam na planície de Nova Russas com uma vantagem considerável. Nós nos arrastamos pelo platô em seu teto de 700m do chão. Logo no final do platô me desconectei brevemente, pois encontrei um miolo térmico excelente que me colocou 400m mais alto que os dois, e para tentar pressionar André resolvi me atirar, mesmo não estando na base da nuvem, em sua direção para tentar obrigá-lo a abandonar sua térmica para não me deixar alcançá-lo. A estratégia funcionou muito bem, André aproveitou que já se encontrava em boa altura, para abandonar sua térmica e me tirar a referência. Mesmo assim foi possível encontrar a mesma térmica e assim delinear mais uma para adiantar meus parceiros.
A idéia de voarmos juntos era excelente e só traria benefícios, caso ocorresse de fato. Um exemplo da dificuldade de voar em grupo foi a própria dupla a nossa frente, pois Ceará e André se separaram logo na saída do platô, onde Ceará acabou arriscando mais do que deveria, ficando muito baixo e permitindo que nós o ultrapassássemos. Pressionado por ter sido ultrapassado, Ceará acabou tomando decisões precipitadas e confiou demais na condição. Acabou caindo por volta de 11:00h perto de Nova Russas. O trio seguia forte, e mesmo não coincidindo muito bem com os ciclos, conseguíamos nos deslocar com uma boa velocidade média para o recorde.
André estava voando muito bem e com um timing de ciclos térmicos praticamente perfeito, enquanto nós, sempre 10km atrás,nos arrastávamos sem conseguir pegá-lo. Nosso ritmo foi razoável no trecho Nova Russas (km175) – PedroII (km270). Rastreávamos de forma eficiente e amistosa, o espírito de grupo que imaginamos em nossas conversas finalmente tomava cara, éramos um só organismo. Uma atitude próximo a Pedro II-PI confirmou.
Colocamos-nos numa situação complicada e sobre pressão. Chegamos a Pedro II numa altura crítica para a hora, 500m do chão ás 14:20h, e estávamos presos a uma térmica extremamente fraca que nos tomaria muito tempo para subir, e tempo era uma coisa que não tínhamos, o relógio é sempre o maior inimigo de um recordista. Afinal o objetivo do grupo não era o Xceará e muito menos acumular mais um vôo de 300km. Resolvi partir para a agressividade em prol do grupo. Avisei meus parceiros pelo rádio que arriscaria todas as minhas fichas numa nuvem logo após Pedro II. A resposta foi sensacional: “Se um vai, tem que ir todo mundo. É recorde ou chão!!!”
Um açude grande logo após a cidade de Pedro II com uma nuvem enorme muito bem formada bem acima dele era nosso destino. Nossa bem desenvolvida análise de nuvens não poderia falhar naquele momento tão especial do vôo-livre brasileiro, com três pilotos do mesmo país na iminência de quebrar o recorde mundial juntos. Eram quase 14h30minh e estávamos beirando os 300 km de vôo, ainda tínhamos mais 3 horas de vôo e pouco menos de 150km para o recorde.
Nosso maior medo era entrarmos atrasados no ciclo daquela nuvem, um erro seria fatal naquela altura. Cruzamos o açude e não batemos em nada. Na verdade erramos na navegação, e para a nossa sorte o erro ainda era contornável, pois usamos o chamado ângulo do desespero, quando não resta mais muita opção, o jeito é jogar 90 graus em relação ao vento para encontrar qualquer linha de perturbação que possa ajudar. A teoria ajudou na prática. Jogamos para a direita, batemos numa linha ativa, que era a linha ativa da nuvem, e em meio a uma falhadeira, acabamos encontrando um miolo de uns 3m/s que melhorou bastante nossa situação. Rapidamente estávamos em uma altura confortável e suficiente para continuar nos deslocando.
Fizemos uma pequena transição até a nuvem seguinte, onde finalmente atingimos em cheio o ciclo, nos posicionando muito bem para o horário, 14:40h na base da nuvem há apenas 15 km de PiriPiri-PI (km 310). Uma desconfiança de que o recorde de fato poderia ser batido começava a nos angustiar.
Na transição para PiriPiri enxergamos André muito baixo tentando sobreviver um pouco antes da cidade. Ele de fato cometeu um erro fatal em ficar tão baixo por ali e acabou pousando. Apesar de ter a certeza de que mais cedo ou mais tarde o pegaríamos, um alívio tomou conta do grupo, afinal a partir de agora tudo só dependeria de nós.
O cenário a frente não era dos melhores. Apesar de sempre termos lidado com cirrus e adversidades naquela região final do vôo, aquele céu por um momento nos assustou, pois estava muito úmido e com nuvens estratificadas em camadas médias e baixas da atmosfera. O deslocamento até Barras (km 375)foi muito bem estudado e sem grandes emoções, passamos a direita da cidade um pouco antes das 16:00h. Ainda tínhamos 1h e 45m para o pôr-do-sol, que estava marcado para as 17:43h de acordo com o GPS. Para homologar um recorde devemos cumprir com as regras locais de aviação, e no Brasil aeronaves sem instrumentos adequados para navegação noturna, devem pousar antes do horário do pôr-do-sol.
A partir de Barras-PI tomamos decisões rápidas e estratégicas para nos posicionarmos bem naquelas horas finais. O maior desafio foi conter a ansiedade para manter a velocidade média, que é sem dúvida o ponto mais importante para atingir o objetivo em tempo hábil. O maior problema de voar o dia inteiro é ser capaz de adaptar-se as horas do dia, ou seja, durante a manhã não é necessário ter pressa e assumir muitos riscos que podem facilmente te colocar no chão. A partir das 11:00h a condição já começa a arredondar e já torna-se mais confiável, permitindo um deslocamento mais agressivo e constante, mas o problema principal é durante o final de tarde, quando o piloto já vem com um ritmo acelerado das horas mais fortes do dia e não percebe que chegou a hora de desacelerar o ritmo para não cair. Pilotos demasiadamente agressivos podem até ter a sorte ou encaixar-se perfeitamente nos ciclos, mas acredito ser muito difícil não cometerem erro algum.
Comparo essa transição do meio para o final da tarde com a chegada de uma longa viagem, onde o condutor entra em área urbana num ritmo de rodovia, acima do limite de velocidade e como já está bem perto de casa (recorde) acaba relaxando e perde a concentração pelo cansaço. São nessas circunstâncias que acontecem grande parte dos acidentes. Portanto, assim como dirigindo, é sempre importante manter a concentração e o foco até o final, pois um pequeno erro pode custar caro. Aprendi isso durante dois grandes vôos que realizei em Quixadá, pois quando me aproximava do final deixava minhas emoções tomarem conta das minhas decisões, me atrapalhando a ponto de não me permitirem cumprir meu objetivo. Cai duas vezes a beira de transpor os 400 km por isso.
Em Barras-PI, tomamos talvez a decisão mais sábia do vôo inteiro, forçando quase 90 graus para a direita em direção a uma linha de perturbação que se encontrava acima de uma seqüência de fogueiras. A nuvem que estávamos de olho na verdade nem funcionou direito, mas fomos obrigados a subir bastante tempo em 1,5m/s até atingirmos uma altura segura para pularmos para a próxima queimada. E assim foi, eram 16h30minh quando cruzamos a barreira dos 400 kms, ainda restavam 1h e 15 m de vôo, estávamos juntos e só faltavam 23km para o recorde. Uma euforia tomou conta do grupo e fui muito bem ciceroneado por Marcelo Prieto que nos deu as boas vindas pelo rádio ao seleto grupo de pilotos que passaram dos 400kms. Mas ainda faltava mais um movimento para ganharmos o jogo. Mais uma térmica.
Os planeios após a barreira dos 400 km foram tensos. Eu e Marcelo nos mantivemos frios e céticos até estarmos acima da marca dos 423 km, enquanto Frank já comemorava e já tinha certeza de que bateríamos a marca facilmente. O “go to”do GPS era Miguel Alves-PI (km 455) desde o início do vôo e depois de tudo que passamos, estávamos há pouco mais de 40km da cidade e há apenas 10km do recorde mundial de distância livre. Era o momento de encontrarmos mais uma para garantir.
Alinhamos com uma seqüência de queimadas e chegamos a conclusão de que seria impossível não encontrarmos nada por ali. Nosso instinto funcionou muito bem durante todo o vôo e não seria agora no final que seria diferente. Encontramos um miolo excelente para o horário que nos colocou de volta acima dos 2000m de altura. Era hora de controlar friamente as emoções, pois o recorde mundial havia sido batido, porém nosso objetivo era Miguel Alves-PI e faltavam ainda 30km.
Um dos highlights do vôo sem dúvida foi a chegada ao rio Parnaíba, divisa de estados entre Piauí e Maranhão. Esse planeio foi emocionante. Como falamos desse momento durante tanto tempo, enfim nosso sonho se realizava, 445km de Quixadá e agente realizando nosso último planeio em direção ao tão sonhado Rio Parnaíba. Chegamos lá a 200 metros de altura acima de uma queimada onde encontramos bolhas bem formadas e constantes. Era definitivamente um momento de contemplação. Enfim estávamos 100% realizados, após tantas tentativas, tanto comprometimento e dedicação.
Durante o planeio até o rio, sem dúvida foi o primeiro momento durante todo aquele vôo que consegui relaxar, após 10h e 10m de pura atenção e adrenalina, a cabeça estava livre para pensar em outras coisas. Fiz uma retrospectiva de toda a minha trajetória no vôo-livre e agradeci muito a todos os personagens que me ajudaram a estar ali. Lembrei muito de André Fleury, que certamente estaria ali do nosso lado na parceria caso já estivesse em condições. Definitivamente aquele recorde mundial só estava sendo alcançado no sertão nordestino brasileiro, graças aos esforços de André Fleury e Marcelo Prieto, que durante muitos anos dedicaram seu tempo e conhecimento para desvendar algumas peculiaridades da região. Foi uma quebra de paradigma, pois durante toda a história do vôo-livre no sertão, nunca pensou-se em decolar tão cedo. A janela agora rompia a casa das dez horas voáveis. Com o grande diferencial de vento forte e condições meteorológicas perfeitas.
Olhei para o Cecéu ainda em vôo do meu lado com profunda admiração, afinal eu fui abençoado de tê-lo como professor e sou abençoado de tê-lo como amigo. Sei que pra ele aquele momento era tão especial quanto pra mim. Não por simplesmente quebrar o tal famoso recorde mundial de distância livre em Parapente, mas por ser recompensado em grande estilo depois de tanta busca e perseverança. Foram longos dias fora de casa, suportando muitas críticas, inveja e pressão. E pensar que nada disso foi em vão. O regime de quartel que sempre fizemos questão de impor para manter nossa disciplina, enfim rendia-nos bons frutos.
Subíamos a quase 2,0m/s constante acima do Rio Parnaíba em direção a base da nuvem, eram 17:25h e não tínhamos muito tempo para pousar. De fato é contra meus princípios não cumprir com certas regras de segurança, entretanto após o pôr-do-sol ainda restam pelo menos quinze minutos de luz que permitem perfeitamente pousar em segurança. Se eu não estivesse voando nessas circunstâncias certamente eu aproveitaria cada segundo disponível de luz, porém decidimos abandonar nossa última térmica que nos levaria para os 500km para garantir a homologação do recorde. É justo.
A vegetação do Maranhão já é bem úmida e verde, com árvores e coqueiros enormes que limitam em muito as opções de pouso. Em nosso planeio final ficamos um pouco apreensivos, pois batíamos em bolhas fraquinhas que não nos permitiam perder altura, por ironia chegamos a fazer cálculos de quanto tempo demoraríamos a pousar se continuássemos naquela razão de planeio. De fato se continuássemos naquela linha de bolhas ultrapassaríamos a “deadline”, então fizemos orelhas e procuramos um linha ruim que nos colocasse no chão mais rapidamente. Seguimos uma estrada de terra até uma pequena vila chamada Santana Velha, onde aterrizamos num pequeno campo de futebol. Fomos muito bem recebidos e até um bom arroz e feijão foram servidos bem ao estilo da região. Os locais nunca haviam ouvido falar daquele pedaço de pano voador e por ali nunca havia passado nenhum tipo de aeronave parecida. Perguntavam-nos se havíamos pulado de um avião, e quando explicamos que havíamos saído de Quixadá-CE, fizeram aquela cara de quem está ouvindo mentira. A melhor explicação nessas horas é sempre a mais rápida de se entender, portanto dizíamos que um vento muito forte havia nos levado para lá, em parte era uma grande verdade.
Sem dúvida esportes como o vôo-livre parecem muito imprevisíveis, pois só conseguimos enxergar as cicatrizes deixadas pelos fluxos, mas nunca enxergamos os fluxos em si. Talvez por isso seja tão incompreendido por todos e encarado como um esporte tão perigoso. “É muita coragem...” – a frase mais falada na vila. De fato para quem não pratica deve ser loucura. Afinal passamos mais de dez horas pendurados naquelas linhas a milhares de metros do chão, tomando centenas de decisões, dentro de uma massa que mal enxergamos. Em Quixadá comparo o início do vôo a um rafting, onde a única opção é seguir a correnteza. Mas por mais que pareça uma loucura, existe muito estudo e conhecimento por trás.
Seguimos o plano. Decolamos no coração do Ceará, sobrevoamos todo o estado do Piauí e chegamos muito próximos a região amazônica no Maranhão. Cruzamos uma grande parte do sertão nordestino. Os três juntos. A quebra desse recorde não é simplesmente o rompimento de uma barreira numérica, mas também a prova de que o vôo-livre não necessariamente precisa ser um esporte individual e egocêntrico. Nosso sonho de trabalhar em equipe funcionou. E a equipe não se resume apenas aos pilotos no ar, não podemos esquecer de nosso digníssimo resgate Dioclécio, o Dió, e da SOL Paragliders, que desenvolveu essas velas maravilhosas e nos apoiou muito na conquista.
Quando decidimos voar juntos, sabíamos das adversidades. Somos totalmente programados para competição, portanto nunca olhamos para o piloto ao lado como nosso companheiro, e sim como nosso adversário que devemos em algum momento dispensá-lo. As vitórias são individuais e não existe espaço para mais de um piloto nos degraus do pódio. Quando iniciamos nossa busca pelo recorde em Outubro, me peguei em diversos vôos competindo com meu companheiro Cecéu, quando na verdade deveria apenas ajudá-lo e ser ajudado. É sempre muito mais fácil para todos voar em grupo, mas o difícil é transformar esse grupo em um time. Frank em pouco tempo voando ao nosso lado, entendeu nossa filosofia e já fazia parte dela. Foi uma filosofia também iniciada por André Fleury e Marcelo Prieto, e estamos todos extremamente realizados por ter tido a oportunidade de colocá-la em prática de forma tão perfeita e harmônica, culminando em um Recorde Mundial de Distância Livre.
A Expedição XCNordeste 2007 finalmente chega ao fim. Foram 31 dias investidos em Quixadá, Ceará, Brasil. Três recordes importantes batidos, dois sul-americanos e um mundial de distância livre. Quatro vôos muito importantes (397 km, 414 km, 398 km e 461 km). Mais de 3.000km voados e mais de 8.000km rodados pelo nosso resgate. Sem dúvida um sucesso. Tenho certeza de que após anos investindo pesado nas Expedições XCNordeste, Ary Pradi deve estar muito satisfeito, afinal três pilotos da equipe SOL, voando os novos Tracer 11, realizaram um feito inédito no parapente mundial, 461 km juntos.
A SOL, o Ary e os pilotos merecem.
A equipe SOL gostaria de prestar um agradecimento muito especial a Cláudio Henrique Landim de Fortaleza por todo o seu apoio durante a Expedição XCNordeste 2007.
Abraço a todos e que venham os 500km... Até 2008...
Rafael Saladini
Recorde Mundial - 461,8Km
Tracklog - Marcelo Prieto
Tracklog - Rafael Saladini
Tracklog - Frank Brown
Hoje completamos 31 dias no sertão nordestino e a cada dia que passa o recorde mundial parece mais distante. Os ânimos já estão completamente abalados, a pressão de ter passado tanto tempo em busca de um objetivo já há muito tempo pesa em nossos ombros, e não resta mais muita motivação e nem muitos dias. A situação atual também não é das mais confortáveis, pois durante o XCeará muitos pilotos começaram a copiar nossa estratégia de decolar bem cedo e sobreviver durante a manhã, o que nos pressionou psicologicamente ainda mais. Afinal não seria justo após tantas tentativas e tanto estudo do local, chegar um estrangeiro e quebrar a marca de 423 km. Seria um desastre. O mais importante naquele momento era tentar abstrair toda a pressão e confiar em nossa própria capacidade.
Meu vício de abrir a cortina do quarto para checar a condição pela manhã não existe mais. Prefiro não mais ter opinião sobre o dia antes de chegar a Monsenhor Tabosa voando. Mas logo na subida da rampa, já havia uma densa camada de umidade em médias camadas da atmosfera desanimando muito os pilotos. Alguns pilotos até riram quando colocamos a vela em posição de decolagem, o cenário indicava um prego logo atrás da rampa em Custódio.
Havíamos combinado em voarmos juntos para acelerar a velocidade média até o fim do dia. A dúvida era saber se isso seria possível, afinal voar dez horas completamente juntos no mesmo ritmo seria extremamente difícil. Decolamos as 7:20h completamente desacreditados pelos que nos observavam. Alguns outros pilotos corajosos decolaram no mesmo horário.
Logo na saída o plano de voarmos juntos já não funcionou. Nos separamos na primeira térmica e acabei saindo da rampa em companhia de Francisco Ceará e André Modelo, enquanto Frank e Cecéu resolveram esperar mais alguns minutos. Minha saída foi desastrosa, minha segunda térmica praticamente não existiu, eu acabei me separando de todo mundo e fui para uma altura crítica próximo a serra do padre (km 15). Cheguei a 150 metros de altura embaixo de uma região completamente sombreada, eram quase 8:00h e minha situação não era nada confortável. Com muito custo consegui encontrar uma maneira de sobreviver e voltar para o vôo.
Cecéu e Frank saíram um pouco atrás também em situação complicada, cruzando uma extensa região úmida e muito sombreada. Conseguiram sobreviver se arrastando pelos monólitos daquele inicio de vôo. Enquanto isso, André e Ceará deslocavam-se por uma rota um pouco mais a direita e já engatavam numa condição muito bem formada, colocando uns bons 10 km a nossa frente. Minha ansiedade era grande, mas ainda restavam mais de 9 horas de vôo.
Quando avistei Frank e Cecéu juntos há cinco quilômetros de mim, pensei que poderíamos facilmente conectar em pouco tempo. Errado. Como era muito cedo e os ciclos ainda estavam bem curtos, não consegui me manter no mesmo lugar e fui obrigado a continuar adiante sozinho até que eventualmente eles pudessem me alcançar para juntarmos o grupo.
Antes de Madalena chegamos a ficar bem próximos, mas como minha linha de térmicas estava funcionando bem melhor, acabei me adiantando ainda mais em relação a eles. Frank e Cecéu escolheram uma linha complicada, que os manteve o tempo inteiro com a corda no pescoço até o platô de Monsenhor Tabosa. O resumo desse inicio de vôo era um cenário complicado, com nuvens estratificadas em camadas médias da atmosfera filtrando muito o sol já fraco da manhã, o grupo desmantelado com Cecéu e Frank juntos não conseguindo se deslocar satisfatoriamente para me alcançar, eu totalmente sozinho a frente com um medo enorme de cair, André e Ceará com 10km de vantagem e a total certeza de que se sobrevivêssemos a manhã, facilmente chegaríamos nos 400kms. Mas nós tínhamos um problema, uma dupla de pilotos extremamente competentes e capazes, voando juntos a nossa frente. Isso significava que estávamos atrasados.
Minha ansiedade em conseguir me aproximar da dupla era tão grande quanto a minha ansiedade em conectar com Cecéu e Frank. Resolvi acima de tudo controlar minha ansiedade e mentalizar sobre a minha real situação. Correr sozinho não adiantaria nada e seria assumir um risco muito grande para a hora. E mesmo que conectasse com André e Ceará, pilotos antigos e experientes, acredito que sozinho não teria condições de influenciar nas decisões deles. Minha idéia era atrasá-los ao máximo para dar tempo ao Cecéu e Frank de me pegarem. Optei por confiar na capacidade do nosso trio para pegá-los mais tarde. Decisão conservadora que talvez tenha sido importantíssima para ajudar o grupo.
Assim que pulei para o platô de Monsenhor Tabosa, voando burocraticamente consegui dar tempo para que meus companheiros se juntassem a mim. Fiquei enrolando numa bolha fraca para delinear a linha de perturbação para que eles tivessem mais segurança em pular mais rápido e mais baixo. Funcionou. Estávamos no km 110 e finalmente conectamos o time. Um recorde mundial estava sendo construído naquele momento.
André e Ceará cruzaram a serra de Tabosa e rapidamente entravam na planície de Nova Russas com uma vantagem considerável. Nós nos arrastamos pelo platô em seu teto de 700m do chão. Logo no final do platô me desconectei brevemente, pois encontrei um miolo térmico excelente que me colocou 400m mais alto que os dois, e para tentar pressionar André resolvi me atirar, mesmo não estando na base da nuvem, em sua direção para tentar obrigá-lo a abandonar sua térmica para não me deixar alcançá-lo. A estratégia funcionou muito bem, André aproveitou que já se encontrava em boa altura, para abandonar sua térmica e me tirar a referência. Mesmo assim foi possível encontrar a mesma térmica e assim delinear mais uma para adiantar meus parceiros.
A idéia de voarmos juntos era excelente e só traria benefícios, caso ocorresse de fato. Um exemplo da dificuldade de voar em grupo foi a própria dupla a nossa frente, pois Ceará e André se separaram logo na saída do platô, onde Ceará acabou arriscando mais do que deveria, ficando muito baixo e permitindo que nós o ultrapassássemos. Pressionado por ter sido ultrapassado, Ceará acabou tomando decisões precipitadas e confiou demais na condição. Acabou caindo por volta de 11:00h perto de Nova Russas. O trio seguia forte, e mesmo não coincidindo muito bem com os ciclos, conseguíamos nos deslocar com uma boa velocidade média para o recorde.
André estava voando muito bem e com um timing de ciclos térmicos praticamente perfeito, enquanto nós, sempre 10km atrás,nos arrastávamos sem conseguir pegá-lo. Nosso ritmo foi razoável no trecho Nova Russas (km175) – PedroII (km270). Rastreávamos de forma eficiente e amistosa, o espírito de grupo que imaginamos em nossas conversas finalmente tomava cara, éramos um só organismo. Uma atitude próximo a Pedro II-PI confirmou.
Colocamos-nos numa situação complicada e sobre pressão. Chegamos a Pedro II numa altura crítica para a hora, 500m do chão ás 14:20h, e estávamos presos a uma térmica extremamente fraca que nos tomaria muito tempo para subir, e tempo era uma coisa que não tínhamos, o relógio é sempre o maior inimigo de um recordista. Afinal o objetivo do grupo não era o Xceará e muito menos acumular mais um vôo de 300km. Resolvi partir para a agressividade em prol do grupo. Avisei meus parceiros pelo rádio que arriscaria todas as minhas fichas numa nuvem logo após Pedro II. A resposta foi sensacional: “Se um vai, tem que ir todo mundo. É recorde ou chão!!!”
Um açude grande logo após a cidade de Pedro II com uma nuvem enorme muito bem formada bem acima dele era nosso destino. Nossa bem desenvolvida análise de nuvens não poderia falhar naquele momento tão especial do vôo-livre brasileiro, com três pilotos do mesmo país na iminência de quebrar o recorde mundial juntos. Eram quase 14h30minh e estávamos beirando os 300 km de vôo, ainda tínhamos mais 3 horas de vôo e pouco menos de 150km para o recorde.
Nosso maior medo era entrarmos atrasados no ciclo daquela nuvem, um erro seria fatal naquela altura. Cruzamos o açude e não batemos em nada. Na verdade erramos na navegação, e para a nossa sorte o erro ainda era contornável, pois usamos o chamado ângulo do desespero, quando não resta mais muita opção, o jeito é jogar 90 graus em relação ao vento para encontrar qualquer linha de perturbação que possa ajudar. A teoria ajudou na prática. Jogamos para a direita, batemos numa linha ativa, que era a linha ativa da nuvem, e em meio a uma falhadeira, acabamos encontrando um miolo de uns 3m/s que melhorou bastante nossa situação. Rapidamente estávamos em uma altura confortável e suficiente para continuar nos deslocando.
Fizemos uma pequena transição até a nuvem seguinte, onde finalmente atingimos em cheio o ciclo, nos posicionando muito bem para o horário, 14:40h na base da nuvem há apenas 15 km de PiriPiri-PI (km 310). Uma desconfiança de que o recorde de fato poderia ser batido começava a nos angustiar.
Na transição para PiriPiri enxergamos André muito baixo tentando sobreviver um pouco antes da cidade. Ele de fato cometeu um erro fatal em ficar tão baixo por ali e acabou pousando. Apesar de ter a certeza de que mais cedo ou mais tarde o pegaríamos, um alívio tomou conta do grupo, afinal a partir de agora tudo só dependeria de nós.
O cenário a frente não era dos melhores. Apesar de sempre termos lidado com cirrus e adversidades naquela região final do vôo, aquele céu por um momento nos assustou, pois estava muito úmido e com nuvens estratificadas em camadas médias e baixas da atmosfera. O deslocamento até Barras (km 375)foi muito bem estudado e sem grandes emoções, passamos a direita da cidade um pouco antes das 16:00h. Ainda tínhamos 1h e 45m para o pôr-do-sol, que estava marcado para as 17:43h de acordo com o GPS. Para homologar um recorde devemos cumprir com as regras locais de aviação, e no Brasil aeronaves sem instrumentos adequados para navegação noturna, devem pousar antes do horário do pôr-do-sol.
A partir de Barras-PI tomamos decisões rápidas e estratégicas para nos posicionarmos bem naquelas horas finais. O maior desafio foi conter a ansiedade para manter a velocidade média, que é sem dúvida o ponto mais importante para atingir o objetivo em tempo hábil. O maior problema de voar o dia inteiro é ser capaz de adaptar-se as horas do dia, ou seja, durante a manhã não é necessário ter pressa e assumir muitos riscos que podem facilmente te colocar no chão. A partir das 11:00h a condição já começa a arredondar e já torna-se mais confiável, permitindo um deslocamento mais agressivo e constante, mas o problema principal é durante o final de tarde, quando o piloto já vem com um ritmo acelerado das horas mais fortes do dia e não percebe que chegou a hora de desacelerar o ritmo para não cair. Pilotos demasiadamente agressivos podem até ter a sorte ou encaixar-se perfeitamente nos ciclos, mas acredito ser muito difícil não cometerem erro algum.
Comparo essa transição do meio para o final da tarde com a chegada de uma longa viagem, onde o condutor entra em área urbana num ritmo de rodovia, acima do limite de velocidade e como já está bem perto de casa (recorde) acaba relaxando e perde a concentração pelo cansaço. São nessas circunstâncias que acontecem grande parte dos acidentes. Portanto, assim como dirigindo, é sempre importante manter a concentração e o foco até o final, pois um pequeno erro pode custar caro. Aprendi isso durante dois grandes vôos que realizei em Quixadá, pois quando me aproximava do final deixava minhas emoções tomarem conta das minhas decisões, me atrapalhando a ponto de não me permitirem cumprir meu objetivo. Cai duas vezes a beira de transpor os 400 km por isso.
Em Barras-PI, tomamos talvez a decisão mais sábia do vôo inteiro, forçando quase 90 graus para a direita em direção a uma linha de perturbação que se encontrava acima de uma seqüência de fogueiras. A nuvem que estávamos de olho na verdade nem funcionou direito, mas fomos obrigados a subir bastante tempo em 1,5m/s até atingirmos uma altura segura para pularmos para a próxima queimada. E assim foi, eram 16h30minh quando cruzamos a barreira dos 400 kms, ainda restavam 1h e 15 m de vôo, estávamos juntos e só faltavam 23km para o recorde. Uma euforia tomou conta do grupo e fui muito bem ciceroneado por Marcelo Prieto que nos deu as boas vindas pelo rádio ao seleto grupo de pilotos que passaram dos 400kms. Mas ainda faltava mais um movimento para ganharmos o jogo. Mais uma térmica.
Os planeios após a barreira dos 400 km foram tensos. Eu e Marcelo nos mantivemos frios e céticos até estarmos acima da marca dos 423 km, enquanto Frank já comemorava e já tinha certeza de que bateríamos a marca facilmente. O “go to”do GPS era Miguel Alves-PI (km 455) desde o início do vôo e depois de tudo que passamos, estávamos há pouco mais de 40km da cidade e há apenas 10km do recorde mundial de distância livre. Era o momento de encontrarmos mais uma para garantir.
Alinhamos com uma seqüência de queimadas e chegamos a conclusão de que seria impossível não encontrarmos nada por ali. Nosso instinto funcionou muito bem durante todo o vôo e não seria agora no final que seria diferente. Encontramos um miolo excelente para o horário que nos colocou de volta acima dos 2000m de altura. Era hora de controlar friamente as emoções, pois o recorde mundial havia sido batido, porém nosso objetivo era Miguel Alves-PI e faltavam ainda 30km.
Um dos highlights do vôo sem dúvida foi a chegada ao rio Parnaíba, divisa de estados entre Piauí e Maranhão. Esse planeio foi emocionante. Como falamos desse momento durante tanto tempo, enfim nosso sonho se realizava, 445km de Quixadá e agente realizando nosso último planeio em direção ao tão sonhado Rio Parnaíba. Chegamos lá a 200 metros de altura acima de uma queimada onde encontramos bolhas bem formadas e constantes. Era definitivamente um momento de contemplação. Enfim estávamos 100% realizados, após tantas tentativas, tanto comprometimento e dedicação.
Durante o planeio até o rio, sem dúvida foi o primeiro momento durante todo aquele vôo que consegui relaxar, após 10h e 10m de pura atenção e adrenalina, a cabeça estava livre para pensar em outras coisas. Fiz uma retrospectiva de toda a minha trajetória no vôo-livre e agradeci muito a todos os personagens que me ajudaram a estar ali. Lembrei muito de André Fleury, que certamente estaria ali do nosso lado na parceria caso já estivesse em condições. Definitivamente aquele recorde mundial só estava sendo alcançado no sertão nordestino brasileiro, graças aos esforços de André Fleury e Marcelo Prieto, que durante muitos anos dedicaram seu tempo e conhecimento para desvendar algumas peculiaridades da região. Foi uma quebra de paradigma, pois durante toda a história do vôo-livre no sertão, nunca pensou-se em decolar tão cedo. A janela agora rompia a casa das dez horas voáveis. Com o grande diferencial de vento forte e condições meteorológicas perfeitas.
Olhei para o Cecéu ainda em vôo do meu lado com profunda admiração, afinal eu fui abençoado de tê-lo como professor e sou abençoado de tê-lo como amigo. Sei que pra ele aquele momento era tão especial quanto pra mim. Não por simplesmente quebrar o tal famoso recorde mundial de distância livre em Parapente, mas por ser recompensado em grande estilo depois de tanta busca e perseverança. Foram longos dias fora de casa, suportando muitas críticas, inveja e pressão. E pensar que nada disso foi em vão. O regime de quartel que sempre fizemos questão de impor para manter nossa disciplina, enfim rendia-nos bons frutos.
Subíamos a quase 2,0m/s constante acima do Rio Parnaíba em direção a base da nuvem, eram 17:25h e não tínhamos muito tempo para pousar. De fato é contra meus princípios não cumprir com certas regras de segurança, entretanto após o pôr-do-sol ainda restam pelo menos quinze minutos de luz que permitem perfeitamente pousar em segurança. Se eu não estivesse voando nessas circunstâncias certamente eu aproveitaria cada segundo disponível de luz, porém decidimos abandonar nossa última térmica que nos levaria para os 500km para garantir a homologação do recorde. É justo.
A vegetação do Maranhão já é bem úmida e verde, com árvores e coqueiros enormes que limitam em muito as opções de pouso. Em nosso planeio final ficamos um pouco apreensivos, pois batíamos em bolhas fraquinhas que não nos permitiam perder altura, por ironia chegamos a fazer cálculos de quanto tempo demoraríamos a pousar se continuássemos naquela razão de planeio. De fato se continuássemos naquela linha de bolhas ultrapassaríamos a “deadline”, então fizemos orelhas e procuramos um linha ruim que nos colocasse no chão mais rapidamente. Seguimos uma estrada de terra até uma pequena vila chamada Santana Velha, onde aterrizamos num pequeno campo de futebol. Fomos muito bem recebidos e até um bom arroz e feijão foram servidos bem ao estilo da região. Os locais nunca haviam ouvido falar daquele pedaço de pano voador e por ali nunca havia passado nenhum tipo de aeronave parecida. Perguntavam-nos se havíamos pulado de um avião, e quando explicamos que havíamos saído de Quixadá-CE, fizeram aquela cara de quem está ouvindo mentira. A melhor explicação nessas horas é sempre a mais rápida de se entender, portanto dizíamos que um vento muito forte havia nos levado para lá, em parte era uma grande verdade.
Sem dúvida esportes como o vôo-livre parecem muito imprevisíveis, pois só conseguimos enxergar as cicatrizes deixadas pelos fluxos, mas nunca enxergamos os fluxos em si. Talvez por isso seja tão incompreendido por todos e encarado como um esporte tão perigoso. “É muita coragem...” – a frase mais falada na vila. De fato para quem não pratica deve ser loucura. Afinal passamos mais de dez horas pendurados naquelas linhas a milhares de metros do chão, tomando centenas de decisões, dentro de uma massa que mal enxergamos. Em Quixadá comparo o início do vôo a um rafting, onde a única opção é seguir a correnteza. Mas por mais que pareça uma loucura, existe muito estudo e conhecimento por trás.
Seguimos o plano. Decolamos no coração do Ceará, sobrevoamos todo o estado do Piauí e chegamos muito próximos a região amazônica no Maranhão. Cruzamos uma grande parte do sertão nordestino. Os três juntos. A quebra desse recorde não é simplesmente o rompimento de uma barreira numérica, mas também a prova de que o vôo-livre não necessariamente precisa ser um esporte individual e egocêntrico. Nosso sonho de trabalhar em equipe funcionou. E a equipe não se resume apenas aos pilotos no ar, não podemos esquecer de nosso digníssimo resgate Dioclécio, o Dió, e da SOL Paragliders, que desenvolveu essas velas maravilhosas e nos apoiou muito na conquista.
Quando decidimos voar juntos, sabíamos das adversidades. Somos totalmente programados para competição, portanto nunca olhamos para o piloto ao lado como nosso companheiro, e sim como nosso adversário que devemos em algum momento dispensá-lo. As vitórias são individuais e não existe espaço para mais de um piloto nos degraus do pódio. Quando iniciamos nossa busca pelo recorde em Outubro, me peguei em diversos vôos competindo com meu companheiro Cecéu, quando na verdade deveria apenas ajudá-lo e ser ajudado. É sempre muito mais fácil para todos voar em grupo, mas o difícil é transformar esse grupo em um time. Frank em pouco tempo voando ao nosso lado, entendeu nossa filosofia e já fazia parte dela. Foi uma filosofia também iniciada por André Fleury e Marcelo Prieto, e estamos todos extremamente realizados por ter tido a oportunidade de colocá-la em prática de forma tão perfeita e harmônica, culminando em um Recorde Mundial de Distância Livre.
A Expedição XCNordeste 2007 finalmente chega ao fim. Foram 31 dias investidos em Quixadá, Ceará, Brasil. Três recordes importantes batidos, dois sul-americanos e um mundial de distância livre. Quatro vôos muito importantes (397 km, 414 km, 398 km e 461 km). Mais de 3.000km voados e mais de 8.000km rodados pelo nosso resgate. Sem dúvida um sucesso. Tenho certeza de que após anos investindo pesado nas Expedições XCNordeste, Ary Pradi deve estar muito satisfeito, afinal três pilotos da equipe SOL, voando os novos Tracer 11, realizaram um feito inédito no parapente mundial, 461 km juntos.
A SOL, o Ary e os pilotos merecem.
A equipe SOL gostaria de prestar um agradecimento muito especial a Cláudio Henrique Landim de Fortaleza por todo o seu apoio durante a Expedição XCNordeste 2007.
Abraço a todos e que venham os 500km... Até 2008...
Rafael Saladini
Friday, November 23, 2007
Saturday, November 17, 2007
X-Ceará - Dia 6
Termina hoje o X-Ceará e já estamos a fazer as malas para partir para Fortaleza amanhã cedo. Nos últimos dois dias, apenas meia dúzia de pilotos voaram com a ventosga. Ao que parece, os resultados foram maus. Hoje apenas descolaram 3-4 pilotos e foram catapultados imediatamente para trás da montanha.
O pessoal está todo a relaxar aqui na piscina e á espera da festa de encerramento do evneto que vai contar com a actuação dum grupo de foró.
O Thomas Browner (Checo) vence o evento, seguido pelo Gil Navalho e José Flavio Moreira (cearense).
Os tugas estão satisfeitos por termos participado deste fantástico evento e penso que todos queremos voltar para o ano que vem!
Paulo Reis
O pessoal está todo a relaxar aqui na piscina e á espera da festa de encerramento do evneto que vai contar com a actuação dum grupo de foró.
O Thomas Browner (Checo) vence o evento, seguido pelo Gil Navalho e José Flavio Moreira (cearense).
Os tugas estão satisfeitos por termos participado deste fantástico evento e penso que todos queremos voltar para o ano que vem!
Paulo Reis
Friday, November 16, 2007
X-Ceará - Dia 5
Viva
O Ceará continuar a bombar e os voos terminam por sair! Impressionante, voa-se todos os dias sem excepção. É claro que o momento da descolagem é sempre emocionante e é preciso acreditar piamente na ordem para descolar dada pelo Expert local.
O Team Outsider ontem revelou a sua arma mais letal: Gonçalo Velez, conhecido nalguns locais por Gonçalo "Trepa-Tudo"! O nosso artilheiro trabalhou como observador avançado e...300kilos para o homem, em grande!
De resto tivemos o Brazuka, o Bruto e o Reis a defender posição, ficaram logo no início a mandar canhoadas para o pessoal que pretendia passar. Era só o que faltava, irem para distância, lenha nos gajos e venham para o chão.
Agora sobre o voo de ontem. O início foi muito difícil (tecto a 1300m), mas isso já é habitual. Até Madalena (km60) temos de voar em condições de sobrevivência total. Transições muito curtas, tecto baixo e muito azul. No fundo é aguentar no ar, e esperar que o vento nos leve.
Em Madalena o tecto já batia os 2000m. A partir dai as coisas são "menos" dificeis. Começam a aparecer mais cumulos. No entanto o dia era algo anormal, a térmica era muito turbulenta, e quase impossível de centrar. Tive de me empenhar para a asa não andar a largar peças pelo caminho... Em Monsenhor Tabosa (km120)o tecto já atingia os 2400m (o chão está pelos 200m). Os cumulos começavam a ficar mais apetitosos e surgiam as primeiras linhas de confluência, se bem que curtas. A partir de Poranga as coisas melhoram significativamente, confluências mais definidas. No entanto era necessário decidir o alinhamento a seguir muitos quilometros antes, pois as descendentes são brutais, e o vento não permite andar a "passear" de um lado para o outro à procura da térmica (que inveja que eu tenho das Delta).
Depois de Poranga é que o Ceará mostrou "com quantos paus se faz uma canoa"! Percorri muitos quilos de borla debaixo das confluências. É necessário ter o cuidado para não cair fora delas, e temos de saber escolher muito bem a faixa de altitude de trabalho. Ir junto à base implicava perder muito tempo, e tb estava freskote (tecto a 3000m). Por isso era andar ali a boiar entre os 2700 e os 2400.
O final de dia foi fabuloso. Foi a "cereja no topo do bolo". Depois de um dia em que andei horas a levar porrada da velha, um final de voo com termal suave e a poder apreciar a paisagem... Beleza!
O final do meu voo foi sobre uma zona de floresta com uma única estrada de terra. O cenário é bonito, o vermelho da terra a contrastar com o verde. Aquela zona marca o início da Amazónia, com um floresta ainda baixa, mas numa clara mudança da paisagem relativamente ao Sertão, em que tudo é muito seco... As aterragens, essas são escassas. Mesmo na estrada existem poucos locais, dado que as copas das árvores fecham a estrada e a essa hora não há vento ao nível do solo. E com a restituição é necessário muito espaço para por o estojo no chão.
No final, 336kilos em 8h30 de voo. O vento deu uma ajuda e consegui uma média bem melhor do que no voo anterior.
Hoje não fui voar. As recolhas à brazileira a funcionar no seu melhor. Cheguei ao hotel já depois das 7h, e já tinham saido os primeiros transportes para a descolagem. Mas também não faz mal, o vento esteve muito forte e atravessado. Descolaram muitos poucos pilotos de parapente. O vento e o power da termal eram de tal forma que eles nem sequer conseguiam penetrar, esbarrando na parrede da térmica e a irem direitinhos para o chão. Um pilto brasileiro de parapente relatou que fez vários SIV´s seguidos numa encosta por trás da descolagem! Ao que parece houve um acidente com uma Delta, fez tumbling e partiu. O gajo não conseguio abrir o reserva, e terminou por cair em cima de umas árvores. Tanto quanto ouvi, ele magoou-se mas estava a caminhar, perdeu os instrumentos e por isso não consegue dar as coordenadas do local. Para ajudar à festa não há pilotos a voar hoje para indicar a posição desta delta, e devem estar uns 45º no solo… Acabei de saber através do Chico Santos que o Heli está a chegar agora ao local, e a viatura de assistência está próxima.
Por certo que regressarei ao Ceará para voar. Por isso vão pensado quem quererá vir e juntar-se ao Team Outsider para XC no seu melhor.
Na classificação provisória que afixaram estou em 1º lugar. Mas ainda não constam lá os descartes, pelo que deve vencer a prova o Thomas Brauner e o Navalho em segundo.
Navalho
O Ceará continuar a bombar e os voos terminam por sair! Impressionante, voa-se todos os dias sem excepção. É claro que o momento da descolagem é sempre emocionante e é preciso acreditar piamente na ordem para descolar dada pelo Expert local.
O Team Outsider ontem revelou a sua arma mais letal: Gonçalo Velez, conhecido nalguns locais por Gonçalo "Trepa-Tudo"! O nosso artilheiro trabalhou como observador avançado e...300kilos para o homem, em grande!
De resto tivemos o Brazuka, o Bruto e o Reis a defender posição, ficaram logo no início a mandar canhoadas para o pessoal que pretendia passar. Era só o que faltava, irem para distância, lenha nos gajos e venham para o chão.
Agora sobre o voo de ontem. O início foi muito difícil (tecto a 1300m), mas isso já é habitual. Até Madalena (km60) temos de voar em condições de sobrevivência total. Transições muito curtas, tecto baixo e muito azul. No fundo é aguentar no ar, e esperar que o vento nos leve.
Em Madalena o tecto já batia os 2000m. A partir dai as coisas são "menos" dificeis. Começam a aparecer mais cumulos. No entanto o dia era algo anormal, a térmica era muito turbulenta, e quase impossível de centrar. Tive de me empenhar para a asa não andar a largar peças pelo caminho... Em Monsenhor Tabosa (km120)o tecto já atingia os 2400m (o chão está pelos 200m). Os cumulos começavam a ficar mais apetitosos e surgiam as primeiras linhas de confluência, se bem que curtas. A partir de Poranga as coisas melhoram significativamente, confluências mais definidas. No entanto era necessário decidir o alinhamento a seguir muitos quilometros antes, pois as descendentes são brutais, e o vento não permite andar a "passear" de um lado para o outro à procura da térmica (que inveja que eu tenho das Delta).
Depois de Poranga é que o Ceará mostrou "com quantos paus se faz uma canoa"! Percorri muitos quilos de borla debaixo das confluências. É necessário ter o cuidado para não cair fora delas, e temos de saber escolher muito bem a faixa de altitude de trabalho. Ir junto à base implicava perder muito tempo, e tb estava freskote (tecto a 3000m). Por isso era andar ali a boiar entre os 2700 e os 2400.
O final de dia foi fabuloso. Foi a "cereja no topo do bolo". Depois de um dia em que andei horas a levar porrada da velha, um final de voo com termal suave e a poder apreciar a paisagem... Beleza!
O final do meu voo foi sobre uma zona de floresta com uma única estrada de terra. O cenário é bonito, o vermelho da terra a contrastar com o verde. Aquela zona marca o início da Amazónia, com um floresta ainda baixa, mas numa clara mudança da paisagem relativamente ao Sertão, em que tudo é muito seco... As aterragens, essas são escassas. Mesmo na estrada existem poucos locais, dado que as copas das árvores fecham a estrada e a essa hora não há vento ao nível do solo. E com a restituição é necessário muito espaço para por o estojo no chão.
No final, 336kilos em 8h30 de voo. O vento deu uma ajuda e consegui uma média bem melhor do que no voo anterior.
Hoje não fui voar. As recolhas à brazileira a funcionar no seu melhor. Cheguei ao hotel já depois das 7h, e já tinham saido os primeiros transportes para a descolagem. Mas também não faz mal, o vento esteve muito forte e atravessado. Descolaram muitos poucos pilotos de parapente. O vento e o power da termal eram de tal forma que eles nem sequer conseguiam penetrar, esbarrando na parrede da térmica e a irem direitinhos para o chão. Um pilto brasileiro de parapente relatou que fez vários SIV´s seguidos numa encosta por trás da descolagem! Ao que parece houve um acidente com uma Delta, fez tumbling e partiu. O gajo não conseguio abrir o reserva, e terminou por cair em cima de umas árvores. Tanto quanto ouvi, ele magoou-se mas estava a caminhar, perdeu os instrumentos e por isso não consegue dar as coordenadas do local. Para ajudar à festa não há pilotos a voar hoje para indicar a posição desta delta, e devem estar uns 45º no solo… Acabei de saber através do Chico Santos que o Heli está a chegar agora ao local, e a viatura de assistência está próxima.
Por certo que regressarei ao Ceará para voar. Por isso vão pensado quem quererá vir e juntar-se ao Team Outsider para XC no seu melhor.
Na classificação provisória que afixaram estou em 1º lugar. Mas ainda não constam lá os descartes, pelo que deve vencer a prova o Thomas Brauner e o Navalho em segundo.
Navalho
Thursday, November 15, 2007
X-Ceará - Dia 4
Pela manhã estava mais vento que nos dias anteriores, céu mais azul e descolagens mais emocionantes. O primeiro grupo não se safou e ficou aterrado entre Quixada e Madalena (num raio de 66 kms). Os pilotos da Sol não descolaram hoje (como é obvio), sendo que apenas poucos pilotos conseguiram ultrapassar a dificuldade de passar Madalena. Todos os Tugas descolaram ainda antes das 8.00h da manhã e apenas o Gonçalo e o Gil passaram Madalena. Segundo notícias recentes, o Gonçalo já ia com 200 kms e o Gil com cerca de 300 kms voados e em voo (às 4.15h locais). Ainda não sabemos ao certo as distâncias que eles conseguiram alcançar????
Pela quantidade de pilotos que estão aqui na pousada, suspeitamos que muito poucos pilotos tenham conseguido fazer voos longos no dia de hoje.
O Carlos Brazuka é que é negro, mas hoje foi o dia negro do Paulo Reis. Foi atacado e picado por diversas abelhas (maribondos) na descolagem e queimou a perna no tubo de escape de um moto-taxi...
Não deixem de ver mais fotos no slideshow em tamanho grande.
Acabámos de saber que O Gil Navalho fez 336 kms hoje e possivelmente passou para 1º lugar da classificação geral da prova??? Depois confirmamos este resultado!
Hoje foi também batido o Recorde Brasileiro Feminino de Asa Delta pela piloto Flavinha com um voo de 225 kms.
Pela quantidade de pilotos que estão aqui na pousada, suspeitamos que muito poucos pilotos tenham conseguido fazer voos longos no dia de hoje.
O Carlos Brazuka é que é negro, mas hoje foi o dia negro do Paulo Reis. Foi atacado e picado por diversas abelhas (maribondos) na descolagem e queimou a perna no tubo de escape de um moto-taxi...
Não deixem de ver mais fotos no slideshow em tamanho grande.
Acabámos de saber que O Gil Navalho fez 336 kms hoje e possivelmente passou para 1º lugar da classificação geral da prova??? Depois confirmamos este resultado!
Hoje foi também batido o Recorde Brasileiro Feminino de Asa Delta pela piloto Flavinha com um voo de 225 kms.
Wednesday, November 14, 2007
461,6 kms - Novo recorde do Mundo de Parapente
O recorde do mundo de parapente foi batido!!!!!!!
Os pilotos estavam aos 1900m às 16.30 e tinham feito 420 kms. O recorde já era! Por aqui estivémos a fazer apostas para a distância do recorde ???? :-) Teoricamente eles tinham mais uma hora de voo pela frente e não brincam em serviço!
Os três pilotos acabaram de aterrar juntos e fizeram 461,6 kms. Foi um dia atípico onde ninguém acreditava que hoje pudesse ser possível. As primeiras horas de voo foram lentas, mas entrou uma frente fria a meio do dia que os deve ter empurrado em frente na fase final do voo.
Inté
Paulo Reis, Carlos Brazuka, Gil Navalho, João Brito e Gonçalo Velez.
Os pilotos estavam aos 1900m às 16.30 e tinham feito 420 kms. O recorde já era! Por aqui estivémos a fazer apostas para a distância do recorde ???? :-) Teoricamente eles tinham mais uma hora de voo pela frente e não brincam em serviço!
Os três pilotos acabaram de aterrar juntos e fizeram 461,6 kms. Foi um dia atípico onde ninguém acreditava que hoje pudesse ser possível. As primeiras horas de voo foram lentas, mas entrou uma frente fria a meio do dia que os deve ter empurrado em frente na fase final do voo.
Inté
Paulo Reis, Carlos Brazuka, Gil Navalho, João Brito e Gonçalo Velez.
Recorde do Mundo batido em Quixadá
Foi batido o Recorde do Mundo de Parapente de distância livre pelos pilotos da equipa SOL, Frank Brown, Marcelo Prieto (Ceceu) e Rafael Saladini (Sardinha). Os 3 pilotos ainda estão a voar e já passaram a marca do recorde anterior. Segundo as últimas notícias ainda ainda poderão ter uma hora de voo pela frente, pelo que o recorde se pode aproximar dos 480 kms.
X-Ceará - Dia 3 (Possível dia de recorde do mundo)
Neste exacto momento, ás 14.20h da tarde (local), os 3 pilotos da equipa Sol (ceceu, Frank Brown e Rafael Saladini), continuam em voo por baixo de uma núvem á sombra com 380 kms completos. Ainda têm 1.30h ou 2.00h de voo possível pela frente. É bem possível que caia hoje o recorde do mundo de Parapente?????
X-Ceará - Dia 3 (Possível dia de recorde do mundo)
Hoje, acabámos de ter a notícia que até ao momento o Gil Navalho está em 3º lugar da classificação geral provisória, Tomas Brauner (Checo) em 1º e Brett Zaengelein (Americano) em 2º.
Neste exacto momento (17.30h hora Portuguesa), estão 4 pilotos em voo com 280 kms feitos e ainda com 4.30h para voar pela frente. Esses pilotos são o: Frank Brown, Ceceu, Rafael Saladini e André Modelo. Toda a gente por aqui acha que é hoje o dia em que o recorde vai cair!
Neste terceiro dia o Paulo Reis, João Brito, Gil Navalho, descolámos bem cedo, ainda antes das 8.00h da manhã e após a saída para distância dos quatro primeiros pilotos, conseguimos sair juntamente com o grupo dos "caça recordes". O Gil conseguiu seguir com eles, mas eu e o João atrasámo-nos um pouco, pois este pessoal anda com um ritmo muito elevado e é dificil acompanhar. Também houve um momento de excitação depois de assistirmos a uma cascata de incidentes com um piloto, que seguia à nossa frente e que felizmente foi resolvido perto do chão e o piloto seguiu a voar.
O Carlos Brazuka descolou com o Tomas Browner e o Bratt Zangelain (1º e 2º classificados da prova) e deixou-os ficar aterrados logo atrás da descolagem e seguiu voando. Ficando a meio caminho entre Quixadá e Madalena, local onde ficou também o Paulo Reis e o João Brito ficou uns 10 kms à frente de ambos. O Paulo Reis esteve a fazer termo-dinâmico em frente a uns rochedos a 100 m do chão de acelerador a fundo e mesmo assim teve de se atirar para trás da encosta. Neste dia andava-se a 80-90 kms/h com vento de costas.
O Paulo Reis ainda conseguiu apanhar uma boleia de uma carrinha e fazer um segundo voo, já com muito vento e alguns Cb´s a formarem-se. O Vário do Compeo, marcou 106kms/h de velocidade máxima a certa altura. Deve ter sido dos últimos pilotos a descolarem, pois o vento já estava muito forte, tendo de avançar de acelerador a fundo, com o céu todo tapado e poucas ascendências, tendo aterrado de novo na mesma zona do primeiro voo, juntamente com algumas Asas Delta com quem voou. O João Brito esteve a socorrer um piloto que se acidentou perto dele ao aterrar com vento forte. Á partida não deve ser nada de grave e o socorro foi rápido e eficaz! Não temos notícias do Gonçalo que foi mais tarde para a rampa???? O Carlos Brazuka está a receber um massagem aqui no hotel e eu devo ir a seguir! Estivémos a tomar banho na psicina e o João Brito está a dormir numa rede com uma paisagem fantástica. Se pudermos daremos notícias do voo do Gonçalo. O Gil acabou de chegar e aterrou em Madalena (60 kms).
Neste exacto momento (17.30h hora Portuguesa), estão 4 pilotos em voo com 280 kms feitos e ainda com 4.30h para voar pela frente. Esses pilotos são o: Frank Brown, Ceceu, Rafael Saladini e André Modelo. Toda a gente por aqui acha que é hoje o dia em que o recorde vai cair!
Neste terceiro dia o Paulo Reis, João Brito, Gil Navalho, descolámos bem cedo, ainda antes das 8.00h da manhã e após a saída para distância dos quatro primeiros pilotos, conseguimos sair juntamente com o grupo dos "caça recordes". O Gil conseguiu seguir com eles, mas eu e o João atrasámo-nos um pouco, pois este pessoal anda com um ritmo muito elevado e é dificil acompanhar. Também houve um momento de excitação depois de assistirmos a uma cascata de incidentes com um piloto, que seguia à nossa frente e que felizmente foi resolvido perto do chão e o piloto seguiu a voar.
O Carlos Brazuka descolou com o Tomas Browner e o Bratt Zangelain (1º e 2º classificados da prova) e deixou-os ficar aterrados logo atrás da descolagem e seguiu voando. Ficando a meio caminho entre Quixadá e Madalena, local onde ficou também o Paulo Reis e o João Brito ficou uns 10 kms à frente de ambos. O Paulo Reis esteve a fazer termo-dinâmico em frente a uns rochedos a 100 m do chão de acelerador a fundo e mesmo assim teve de se atirar para trás da encosta. Neste dia andava-se a 80-90 kms/h com vento de costas.
O Paulo Reis ainda conseguiu apanhar uma boleia de uma carrinha e fazer um segundo voo, já com muito vento e alguns Cb´s a formarem-se. O Vário do Compeo, marcou 106kms/h de velocidade máxima a certa altura. Deve ter sido dos últimos pilotos a descolarem, pois o vento já estava muito forte, tendo de avançar de acelerador a fundo, com o céu todo tapado e poucas ascendências, tendo aterrado de novo na mesma zona do primeiro voo, juntamente com algumas Asas Delta com quem voou. O João Brito esteve a socorrer um piloto que se acidentou perto dele ao aterrar com vento forte. Á partida não deve ser nada de grave e o socorro foi rápido e eficaz! Não temos notícias do Gonçalo que foi mais tarde para a rampa???? O Carlos Brazuka está a receber um massagem aqui no hotel e eu devo ir a seguir! Estivémos a tomar banho na psicina e o João Brito está a dormir numa rede com uma paisagem fantástica. Se pudermos daremos notícias do voo do Gonçalo. O Gil acabou de chegar e aterrou em Madalena (60 kms).
X-Ceará - Dia 2
No segundo dia chegámos às 7.30h à rampa e o vento atingia picos de 68 kms/h. Entre deltas e parapentes, apenas descolaram 12 pilotos durante todo o dia. A manga não foi válida por não terem descolado os 20% dos pilotos necessários. O primeiro a descolar foi o Frank Brown, que descolou no meio da ventania e foi aterrar a 60 kms daqui em Madalena. O dia ficou azul muito cedo, o vento tardou em diminuir e a maior parte dos pilotos abandonou a rampa incluindo nós. Neste dia, ouve um lançamento de reserva dum piloto brasileiro que não sofreu nenhuma lesão. O Gonçalo Velez foi o único resistente (entre os Tugas) e esperou até às 2.30h para fazer um voo e mesmo assim conseguiu fazer 120 kms, aterrando já de noite e andou perdido. Foi resgatado e chegou ao hotel por volta das 3.00h da manhã! Aproveitamos para conecer a cidade, beber uma água de côco gelada, almoçar num buffet de carnes, etc... O Gil Navalho passou o dia a dormir, pois estava de rastos depois do voo estenuante do dia anterior.
Monday, November 12, 2007
X-Ceará em directo amanhã às 11.00 da noite.
Pessoal,
Quem quiser acompanhar em directo na internet o filme do X-Ceará basta acessar o website Terminal X às 11.00h da noite (hora portuguesa). Vão passar o filme e podem participar num chat com os pilotos que estiverem por cá.
Http://www.terminalx.com.br
Quem quiser acompanhar em directo na internet o filme do X-Ceará basta acessar o website Terminal X às 11.00h da noite (hora portuguesa). Vão passar o filme e podem participar num chat com os pilotos que estiverem por cá.
Http://www.terminalx.com.br
Primeiro dia de prova - Um Tuga em grande
O Gil Navalho deve ter sido o 3º piloto a voar mais longe no dia, entre Parapentes e Asa Delta. Ainda não sabemos, mas é bem possivel que tenha sido o 2º entre os parapentes. Segundo o Gil, ele voou 275 kms em 8.50h.
Chegámos à descolagem por volta das 7.30h na altura em que descolavam os primeiros pliotos. Neste grupo estvama os pilotos brasieleiros que bateram recordes nas semanas anteriores e o Frank Brown. O grupo acabaria por aterrar quase todo a 60 kms. Descolámos pouco depois deste grupo e o Gil foi o primeiro a sair para distância e todos os outros em seguida. Ainda não tivémos notícias do Gonçalo Velez, mas o Paulo Reis aterrou muito perto da rampa depois de esperar cerca de 1.00h em frente à descolagem que as condições melhorassem antes de sair. O Brazuka fez 60 kms e o João Brito fez 67 kms e aterraram perto da povoação de Madalena, onde ficaram muitos pilotos aterrados.
O voo aqui é muito técnico e temos de tomar muitas decisões, sendo que a descolagem deve ser feita cedo com condições fracas, pois o vento em seguida aumenta. As boas condições apenas melhoram a partir das 11.00h e até lá é sobrevivência pura com tectos baixos. A decisão de partir sozinho para distância pode ser a "morte do artista"
Vamos jantar e dormir, pois amanhã há mais, esperamos que o Gil chegue a tempo e em condições para voar outra vez amanhã?
Chegámos à descolagem por volta das 7.30h na altura em que descolavam os primeiros pliotos. Neste grupo estvama os pilotos brasieleiros que bateram recordes nas semanas anteriores e o Frank Brown. O grupo acabaria por aterrar quase todo a 60 kms. Descolámos pouco depois deste grupo e o Gil foi o primeiro a sair para distância e todos os outros em seguida. Ainda não tivémos notícias do Gonçalo Velez, mas o Paulo Reis aterrou muito perto da rampa depois de esperar cerca de 1.00h em frente à descolagem que as condições melhorassem antes de sair. O Brazuka fez 60 kms e o João Brito fez 67 kms e aterraram perto da povoação de Madalena, onde ficaram muitos pilotos aterrados.
O voo aqui é muito técnico e temos de tomar muitas decisões, sendo que a descolagem deve ser feita cedo com condições fracas, pois o vento em seguida aumenta. As boas condições apenas melhoram a partir das 11.00h e até lá é sobrevivência pura com tectos baixos. A decisão de partir sozinho para distância pode ser a "morte do artista"
Vamos jantar e dormir, pois amanhã há mais, esperamos que o Gil chegue a tempo e em condições para voar outra vez amanhã?
Sunday, November 11, 2007
Voo de Quixadá a Quixeramobim
O voo de treio no foi bastante agradável, 4 pilotos Tugas chegaram ao golo e o ùnico que não chegou, ficou perto. Descolámos por volta das 13.00h e embora estivessem ciclos fortes todos conseguimos descolar sem problemas de maior, tecto a 2300m, térmicas falhadas junto ao chão. O Carlos Brazuka ganhou a manga, o Paulo Reis foi segundo e o Gonçalo Velez quarto. O Gil engonhou para treinar e atrasou-se a chegar ao golo. O patrocinador está satisfeito com os resultados da "Team Outsider" :-) Foi pena isto não valer para nada hoje e amanhã começa a prova. Depois do voo tivémos direito aum valente Churrasco em Quxeramobim e agora (8.30h)estamos a jantar para ir dormir a seguir, pois planeamos ir para a descolagem por volta das 7.00h da manhã. Os pilotos que descolaram esta manhã cedo fizeram 180 kms e desitiram do voo, pois a média de voo não ia dar para bater o recorde e preferiram poupar-se para amanhã. Estão 65 pilotos inscritos e ainda estão a chegar mais alguns.
A paisagem é totalmente diferente daquilo que estamos habituados. Sofre-se bastante de desidratação e temos de ter cuidados redobrados e beber abundantemente. O pessoal está todo a levar 2 camel backs para o voo (cerca de 5 litradas só para o caminho).
Estamos todos ansiosos por enfrentar um voo de muitas horas. Por isso se amanhã não houver novas para o pessoal é porque ainda estamos a ser recolhidos...
Navalho, Outsider
A paisagem é totalmente diferente daquilo que estamos habituados. Sofre-se bastante de desidratação e temos de ter cuidados redobrados e beber abundantemente. O pessoal está todo a levar 2 camel backs para o voo (cerca de 5 litradas só para o caminho).
Estamos todos ansiosos por enfrentar um voo de muitas horas. Por isso se amanhã não houver novas para o pessoal é porque ainda estamos a ser recolhidos...
Navalho, Outsider
X-Ceará - Dias de treino
Chegámos ontém a Quixada, depois dum dia de relax em Fortaleza onde nos reunimos (todos os tugas) e entretivémo-nos a fazer compras e a descontrarir na praia. Ainda chegámos a tempo de fazer um voo de final de dia ontém, com vento fraco. Hoje despertámos com a visão de 6 parapentes (equipa SOL) no ar às 7.00h da manhã naquilo que parecia ser um bom dia. Eles estavam preparados para sair para distância. Nós infelizmente não pudémos voar, pois tivémos de tratar das inscrições, briefings, etc...
Ficámos frustrados, pois já são 11.30h, ainda estamos à espera do briefing e as coisas estão atrasadas. Hoje temos uma provinha curta de 36 kms (extra competição) para irmos aterrar num belo local para almoçarmos numa fazenda.
Amanhã começam as hostilidades, embora hoje já muitos pilotos (fora da prova) vão fazer muitos kms. Estão por cá muitos mais pilotos que no ano anterior e a semana passada houve vários voos de 350 kms. O pessoal anda a dormir bastante e a descansar para estarmos preparadas para as longas horas de voo que pretendemos voar.
Ficámos frustrados, pois já são 11.30h, ainda estamos à espera do briefing e as coisas estão atrasadas. Hoje temos uma provinha curta de 36 kms (extra competição) para irmos aterrar num belo local para almoçarmos numa fazenda.
Amanhã começam as hostilidades, embora hoje já muitos pilotos (fora da prova) vão fazer muitos kms. Estão por cá muitos mais pilotos que no ano anterior e a semana passada houve vários voos de 350 kms. O pessoal anda a dormir bastante e a descansar para estarmos preparadas para as longas horas de voo que pretendemos voar.
Wednesday, November 07, 2007
Faltam apenas alguns dias para o X-Ceará 2007
Estou de partida dentro de algumas horas para O Brasil, para me juntar em Fortaleza aos restantes pilotos Portugueses que já estão por lá a praticar Kite-Surf. No dia 9 à noite vamos ter a festa de abertura do evento em Fortaleza e na manhã seguinte a caravana do X-Ceará parte para Quixadá onde faremos o primeiro voo de treino.
Todos os pilotos Portugueses têm acesso a enviar mensagens através deste Blog. Tentaremos actualizar e enviar notícias por aqui! Não sei se será possível? Não custa tentar?
Enquanto não existem novidades, podem ver as imagens captadas no evento ano passado, nesse local do Sertão Nordestino, mais concretamente em Quixadá (Estado de Ceará, Brasil).
Até breve,
Paulo Reis
Todos os pilotos Portugueses têm acesso a enviar mensagens através deste Blog. Tentaremos actualizar e enviar notícias por aqui! Não sei se será possível? Não custa tentar?
Enquanto não existem novidades, podem ver as imagens captadas no evento ano passado, nesse local do Sertão Nordestino, mais concretamente em Quixadá (Estado de Ceará, Brasil).
Até breve,
Paulo Reis
Sunday, November 04, 2007
Enfim, os 300 kms (Texto de Olympio Faissol)
Com dois vôos de mais de 9 horas em Quixadá, realizei por mais de uma vez meu sonho de voar 300 km. Os vôos, de 358 km e 335 km, podem ser visualizados aqui:
Deixarei os relatos para algum momento tedioso de inverno.
Quixadá realmente é o céu e o inferno. No primeiro dia, em que o Rafa bateu o recorde sul-americano, com 397km, pousei às 8h00. Voltei correndo de moto-taxi para a rampa. Na segunda descolagem, puxei a vela no momento equivocado e voei de ré para o rotor - uma experiência bastante desagradável.
No dia seguinte, a condição estava ainda melhor, com mais nuvens e organizada. Fiz 100km em 2 horas, caindo às 11h00, num venturi ao norte de Tabosa. No momento em que caí, pensava se teria de passar pela mesma, horrenda desilusão do ano passado. Não voltaríamos a ter um dia tão especial como aquele...
Continuei a lutar, mas a condição insistia em azular por volta das 11h00, quando as térmicas passavam a ser falhadas e com cisalhamento. E aí surgia o dilema: seguir lentamente pelo azul ou descansar para o próximo dia?
Somente no domingo (21/10), cravaria os 300. Nesse dia, foi o Rafa quem caiu cedo. Juntos teríamos feito muito mais do que os 335 km que voei (em zig-zag). Cheguei em Piripiri por volta das 16h15, com uma hora e quinze de voo pela frente. Mas um congestus enorme desaguava sobre a planície no Piauí, fechando a rota para Barras, que estava a um planeio. Não importa, já estava satisfeito.
A verdade é que nenhum dos dias em que voamos foi completo (vento forte e alinhado ao longo da rota, cumulus abundantes e ausência de cirrus). No dia seguinte ao meu vôo, o Cecéu bateu a marca do Rafa, voando 414 km, o primeiro voo de mais de 400 em território brasileiro. Pegou cirrus na perna final, vendo as chances de derrubar o recorde mundial irem por água abaixo. Uma pena... Mas é muito provável que o recorde caia em território brasileiro nos próximos dias.
Meu segundo voo longo, de 358 km, foi uma lição de que só se pode dar o dia por terminado ao colocar os pés no chão. O voo começou com condições clássicas, mas azulou no km 70. Daí em diante fui me arrastando pelo azul até pouco antes de Crateús (rota para leste, um pouco ao sul da tradicional). A condição voltou a arredondar somente no km 160, quando já havia salvo o dia a menos de 50m do chão. Nesse dia, o cirrus voltou a nos atrapalhar. Pousei às 17h00, ou seja, não fiz o planeio final, porque a última térmica do dia já era muito fraca para me tirar do chão. O Rafa, que voava uns 15km à minha frente, dispensou o lastro, pousando às 17h40, com 398km.
Nada como a ambição humana... Agora é natural querer os 400. Mas a verdade é que - como disse um escritor mexicano - a Deusa do êxito é uma puta. Sempre haverá pilotos voando mais longe e mais rápido... Quem se apegar demais às cifras, fatalmente terá decepções.
Olhando para trás e fazendo uma retrospectiva dos últimos 6 anos, em que o cross-country tornou secundários todos meus demais interesses, voar mais de 300km terá sido o ponto alto da jornada. E, ainda assim, é uma parte pequena dos muitos momentos espetaculares que esse esporte me proporcionou.
Definitivamente, para mim, o vôo de distância livre põe em cheque qualquer concepção do que seriam, para aqueles que não voam, as férias ideais. Um dia, quando for obrigado a ver pontos turísticos, visitar restaurantes e museus, lembrarei dos gloriosos dias de XC. E, então, olharei com certa incomodidade para o céu e as nuvens, tentando afastar, em vão, a nostalgia dos bons tempos...
Olympio Faissol
Deixarei os relatos para algum momento tedioso de inverno.
Quixadá realmente é o céu e o inferno. No primeiro dia, em que o Rafa bateu o recorde sul-americano, com 397km, pousei às 8h00. Voltei correndo de moto-taxi para a rampa. Na segunda descolagem, puxei a vela no momento equivocado e voei de ré para o rotor - uma experiência bastante desagradável.
No dia seguinte, a condição estava ainda melhor, com mais nuvens e organizada. Fiz 100km em 2 horas, caindo às 11h00, num venturi ao norte de Tabosa. No momento em que caí, pensava se teria de passar pela mesma, horrenda desilusão do ano passado. Não voltaríamos a ter um dia tão especial como aquele...
Continuei a lutar, mas a condição insistia em azular por volta das 11h00, quando as térmicas passavam a ser falhadas e com cisalhamento. E aí surgia o dilema: seguir lentamente pelo azul ou descansar para o próximo dia?
Somente no domingo (21/10), cravaria os 300. Nesse dia, foi o Rafa quem caiu cedo. Juntos teríamos feito muito mais do que os 335 km que voei (em zig-zag). Cheguei em Piripiri por volta das 16h15, com uma hora e quinze de voo pela frente. Mas um congestus enorme desaguava sobre a planície no Piauí, fechando a rota para Barras, que estava a um planeio. Não importa, já estava satisfeito.
A verdade é que nenhum dos dias em que voamos foi completo (vento forte e alinhado ao longo da rota, cumulus abundantes e ausência de cirrus). No dia seguinte ao meu vôo, o Cecéu bateu a marca do Rafa, voando 414 km, o primeiro voo de mais de 400 em território brasileiro. Pegou cirrus na perna final, vendo as chances de derrubar o recorde mundial irem por água abaixo. Uma pena... Mas é muito provável que o recorde caia em território brasileiro nos próximos dias.
Meu segundo voo longo, de 358 km, foi uma lição de que só se pode dar o dia por terminado ao colocar os pés no chão. O voo começou com condições clássicas, mas azulou no km 70. Daí em diante fui me arrastando pelo azul até pouco antes de Crateús (rota para leste, um pouco ao sul da tradicional). A condição voltou a arredondar somente no km 160, quando já havia salvo o dia a menos de 50m do chão. Nesse dia, o cirrus voltou a nos atrapalhar. Pousei às 17h00, ou seja, não fiz o planeio final, porque a última térmica do dia já era muito fraca para me tirar do chão. O Rafa, que voava uns 15km à minha frente, dispensou o lastro, pousando às 17h40, com 398km.
Nada como a ambição humana... Agora é natural querer os 400. Mas a verdade é que - como disse um escritor mexicano - a Deusa do êxito é uma puta. Sempre haverá pilotos voando mais longe e mais rápido... Quem se apegar demais às cifras, fatalmente terá decepções.
Olhando para trás e fazendo uma retrospectiva dos últimos 6 anos, em que o cross-country tornou secundários todos meus demais interesses, voar mais de 300km terá sido o ponto alto da jornada. E, ainda assim, é uma parte pequena dos muitos momentos espetaculares que esse esporte me proporcionou.
Definitivamente, para mim, o vôo de distância livre põe em cheque qualquer concepção do que seriam, para aqueles que não voam, as férias ideais. Um dia, quando for obrigado a ver pontos turísticos, visitar restaurantes e museus, lembrarei dos gloriosos dias de XC. E, então, olharei com certa incomodidade para o céu e as nuvens, tentando afastar, em vão, a nostalgia dos bons tempos...
Olympio Faissol
Wednesday, October 31, 2007
Relato de Rafael Saladini (mais um voo de 398 kms).
Link directo para visualizar o voo do Rafael Saladini de 398 kms realizado no dia 27 de Outubro de 2007.
Link directo para visualizar o voo do Olympio Fayssol de 358 kms realizado no dia 27 de Outubro de 2007.
Acordamos sem muitas pretensões. Uma cmada de estratos forte tapava boa parte do céu. Não existe maneira de saber se o dia será bom sem ir para a rampa. Portanto, mantivémos a disciplina e subimos no mesmo horário de sempre. Os estratos rapidamente começaram a dissipar e as formações matinais melhoraram muito o cenário.
Foi a decolagem mais cedo da minha vida: 6:55h. Oly e Cecéu descolaram dez minutos depois e logo nos encontrámos acima da rampa. Tecto do dia nos tradicionais 800m do chão e a deriva nos levando para sudoeste em direção à rota de Crateús. Formações gordas e com uma actividade constante deram um pequeno exemplo do que seria aquele dia.
No início fiquei um pouco desanimado por nunca ter voado tão longe naquela rota. Para mim, por pura ignorância, não seria um dia que o voo renderia o bastante para voar 430km. Errado. Existem sim muitos buracos e serras que podem atrapalhar a velocidade de cruzeiro, mas também existem passagens que acredito serem o segredo dessa rota. Aprendi voando.
Logo na terceira térmica nos separamos. Na cadeia de monólitos atrás da rampa, os três derivavam com uma bolha muito fraca em direção ao rotor das pedras e para completar ainda havia um juremal daqueles embaixo. Decidi então arriscar sozinho. Uma decisão que facilmente poderia ter me colocado no chão, para fugir daquele impasse e apanhar uma linha de nuvens mais aberta pelo flat em cima do asfalto de Quixeramobim. Deu certo.
Cecéu e Oly derivaram tanto que logo não conseguiam mais penetrar naquele vento Nordeste, canalizado pelos venturis formados pelos Monólitos naquele início de rota, e não conseguiram juntar-se a mim. Não tiveram outra saída a não ser encarar o rotor dos monólitos e tentar salvar o voo por lá mesmo. Enfrentaram uma turbulência desagradável, mas conseguiram encontrar uma saída daquele buraco de juremas.
A partir desse ponto não nos encontrámos mais em voo, com Cecéu e Oly voando pelo topo da cadeia de monólitos à minha direita, e eu sempre aberto pelo flat. Minha rota estava escrita, com um alinhamento de nuvens a 1.000m do chão funcionando perfeitamente e acelerando meus kms iniciais do voo. Mesmo conservador, consegui chegar a Quixeramobim rápido e logo estava a caminho de Boa Viagem.
Cecéu acabou se separando do Oly esticando na frente para tentar emparelhar em rotas diferentes e assim se aproximar de mim em poucos kms. Acabou extremamente baixo para a hora, numa situação complicada, no rotor da serra e sem conseguir subir. Definitivamente a minha decisão lá na terceira térmica do dia me trouxe uma vantagem significativa de posicionamento naquele momento. Além de conseguir percorrer toda a linha rendendo muito bem, me deixou numa posição que me conectou diretamente com outro cloud street logo após Quixeramobim, enquanto Cecéu e Oly acabaram numa região sombreada e atrasaram-se muito.
Os planeios até Boa Viagem renderam bem e fiquei baixo apenas uma vez, logo antes da cidade. Foi um momento delicado, com boa parte da área sombreada e poucas opções obvias de gatilhos. Consegui sair com dificuldade e logo cruzava pela esquerda da cidade, onde de novo consegui voltar à base da nuvem (tecto de 1400m). Cecéu nesse ponto havia recuperado bastante tempo e já se aproximava rápido, tentando conectar comigo para voarmos juntos. Porém, um pouco impaciente, acabou dispensando a sua última bolha de 1,5m/s acreditando que pudesse subir mais forte logo à frente. Caiu às 10:30h.
Com a queda do Cecéu, um desânimo quase me fez cair. O Oly estava 15 km atrás e eu não podia esperá-lo. Outro ponto que me incomodava era que não conhecia mais nada a partir daquele ponto e já havia passado momentos de turbulência severa naquela região em voos anteriores.
Antes de me aventurar pelas serras logo após Boa Viagem, resolvi analisar bem os vales e tentei imaginar os venturis. Muitos vales ali possuem uma tendência nítida de canalizar o vento meteorológico, gerando um cisalhamento forte numa determinada altura, o que pode ser perigoso para pilotos desavisados. Essa análise me posicionou bem para cruzar a serra, e não tive que enfrentar as saias transversais à rota, causa principal da turbulência.
Cheguei a um ponto em que não existe mais opções para evitar as serras, me obrigando a ganhar bastante altura para cruzar a parede com segurança. Por ser uma parede bem formada e com face virada para Leste, era um gatilho perfeito. Coloquei para dentro da núvem e decidi que deveria seguir o voo mesmo sem o Cecéu. A condição parecia redonda e eu não queria desperdiçar aquele dia.
Em dois planeios minha motivação foi sofrendo um revés forte, com uns cirros já tomando conta do horizonte e a condição azulando. Meu objectivo acabou mudando e resolvi que deveria sobreviver até Crateús para almoçar bem por lá. De Boa Viagem para Crateús existe uma área grande pouco habitada e repleta de juremas, com uma única estrada de terra ligando vilas solitárias. Fiquei baixo nessa estrada, pensando que estaria no chão em questão de minutos. Como tinha contacto directo com o resgate, fiquei bem tranquilo. Acabei rastejando por alguns quilómetros e mesmo no azul consegui salvar-me daquela roubada. Oly também não decepcionou, vindo sempre no mesmo ritmo logo atrás de mim.
Sobrevivemos bem até Crateús, separados mas rendendo bem, com o Oly fazendo uma rota um pouco mais pela direita. A condição começou a arredondar bem em Crateús e como a média de velocidade estava boa, resolvi seguir adiante. Em pouco tempo cruzei meu segundo obstáculo, a mesma cordilheira de Poranga mais ao Sul, por Tucuns. Logo estava me deliciando com os canhões fortes que desprendiam do platô, o que acelerou um pouco minha média durante 20 km.
Chegando ao km 300 de voo, o cansaço começou a pegar. Nessa altura do dia, já estava com 8 horas de voo e ainda restavam quase 3 horas de sol. Os 430 km eram perfeitamente possíveis se eu não cometesse mais nenhum erro. Fiz um esforço grande para continuar focado, comendo e me hidratando bem para não deixar o meu ritmo cair. Durante um bom tempo não ficava baixo e acabei cometendo erros logo antes de Castelo do Piauí, onde quase caí. Eram 15h30min e ainda tinha bastante tempo.
O tecto às 15h30m já batia a casa dos 3.000m do chão. Pra quem acha que isso é vantagem, eu pessoalmente discordo. A distância entre as térmicas triplica em relação à manhã, deixando as transições bem mais longas e mais susceptíveis a erro. Esse espaçamento das térmicas ocorre progressivamente durante o voo, e o piloto deve estar preparado para adequar-se a isso. A displicência de cruzar buracos azuis acreditando estar alto suficiente para pegar a próxima pode ser perigoso.
Quando cheguei ao km 340 de voo dei-me conta de que me havia atrasado, e tirando um pouco a esperança de bater os 430 km. Já o Cecéu, que me acompanhava de baixo acreditava que o recorde cairia naquela tarde. A condição estava boa, mas ele me superestimou. Errei algumas vezes no final e acabei me atrasando muito. O Oly também se atrasava constantemente em voo, chegando a ficar por vezes 20km atrás. Meu objectivo passou a ser os 400km.
Por volta do km 360, mesmo sob influência dos cirros, a actividade térmica ainda funcionava bem. Quase cometi um erro fatal que me colocaria no chão às 16h30m. Concentrei-me tanto para não cair que fiquei girando num zerinho por um bom tempo antes de conseguir subir. Mais um erro que me tirou minutos preciosos. Derivei por uns 15 km até ganhar altura, e pelas minhas experiências anteriores de planeios no fim de tarde, para bater os 400kms a partir daquele ponto eu deveria apenas colocar 2500m de altura. Errado.
Nesse momento (17:00h), Oly pousava no km 360, logo antes de Beneditinos, satisfeito com mais um grande voo em seu currículo. Também passou por momentos tensos, muito baixo com mares e mares de juremas logo abaixo. Mais um voo para recordar e uma rota inédita para ele.
Fiz o meu último planeio, saindo de cima da cidade de Beneditinos, com 2600m de altura, já não conseguindo subir mais. Comecei meu último planeio comemorando que havia feito os 400kms. Uma grande ilusão. Saí afundando muito sem entender o que estava acontecendo, afinal eram 17:20h e já não havia mais muita actividade. Teoricamente era pra render muito, mas me renderam apenas vinte e poucos km. Frustrante.
Nos últimos trezentos metros de altura, estiquei para uma estradinha de terra em direcção a vila Lagoa do Piauí (km 415). Nunca tive altura para chegar lá, mas nunca imaginei que fosse ficar tão longe da vila. Resolvi abandonar um pouso mais confortável ao lado de uma casa, para esticar o planeio até onde desse e paguei um preço caro por isso. Em vinte minutos, o sol se pôs completamente e a Lua cheia ainda não havia nascido, uma escuridão desagradável para quem não sabia onde estava e também não tinha ninguém para perguntar. Meu último contacto com o resgate foi logo antes de pousar e fiquei sem falar com o Dióclecio até as 19:30h, ali no meio do nada.
Relutei em caminhar para a casa por causa da escuridão. De cima tudo é tão obvio, as estradas parecem tão simples, mas do chão os parâmetros mudam completamente, ainda mais naquela escuridão total. A "estrada de terra" na verdade não era uma estrada, e sim uma trilha toda acidentada que mal passava um 4x4. Como estava muito cansado e meu ombro estava fadigado, inflamando e doendo muito, por comodidade, resolvi confiar que o Dió chegaria a mim.
Amarrei minha rede em duas árvores e fiquei descansando torcendo para o Dió me achar. Passou-se duas horas que havia pousado e a ansiedade começava a bater. Resolvi que deveria alimentar-me bem. Tinha um litro de água, três barrinhas e uma lata de atum. Meu desgaste em voo havia sido pesado e comecei a sentir-me meio tonto e sonolento. Tirei um cochilo de quinze minutos com o rádio colado nos meus ouvidos. Fui acordado com o resgate tentando contato por volta das 19:30h. As poucas palavras que falei com o Dió me tranquilizaram, afinal ficar no meio do sertão sozinho durante duas horas, sem contacto, na escuridão total e passando mal de cansaço, não é agradável. A Lua cheia começava a nascer, um alívio.
Às 20:00h fui contactado pelo Dió que me informou uma posição apenas 9kms de mim. Comi minha última barrinha e tomei meus últimos goles de água já na certeza de sair dali rápido. Às 21:00h a mesma voz me esclareceu a real situação. Estavam andando em um labirinto onde todos os caminhos terminavam em cercas e propriedades. Era necessário descobrir o nome do local, foi então que resolvi pegar meu GPS, marcar o ponto da minha vela e sair andando naquele caminho de vaca. Caminhei 3 km e cheguei numa casa. Tudo escuro e ninguém ao redor, me deu um medo daquela casa estar abandonada. Gritei e um senhor, muito relutante, resolveu levantar de sua cama para me atender.
Descobri que para chegar a mim o carro deveria dar uma volta enorme até Teresina e voltar através de Lagoa do Piauí. O senhor ma avisou que também havia a possibilidade de caminhar dois km através de uma mata para chegar a outra estrada que encurtaria o tempo em algumas horas. Optei pelo mais rápido. Voltei correndo e busquei minha vela. Até voltar para a fazenda com o equipamento nas costas, já eram 22:00h. Faltavam ainda os tais dois km mata adentro. A explicação do senhor parecia muito simples, mas no caminho tudo parecia confuso. Perdi-me pelas trilhas e em pouco tempo havia perdido a referência.
Eram 22:30h e finalmente encontrei uma casa, após estar completamente perdido naquela mata escura por meia-hora, e ainda passar por um cemitério no meio do nada que me deixou arrepiado. Os locais me guiaram por uma ladeira de pedras que levaria à estrada. Só às 22:50h foi a hora que enxerguei o farol do carro anunciando o sucesso do resgate. Demorou e desgastou, mas foi um sucesso. Tiveram momentos que tive certeza que dormiria no mato. Era um prazer rever meus amigos.
Acordei às 5:30h, descolei às 6:55h, voei durante 10 horas e 40 minutos, pousei as 17:40h, esperei até as 21:00h e caminhei até as 23:00h. Enfim, começamos a voltar para casa. Parámos para comer e decidimos tocar direto para Quixadá madrugada adentro. Chegámos ao hotel às 07h30m do dia 28 de Outubro. Foram 26 horas no ar.
Mais um voo de "quase" 400 km. Total de 398,3km, meu recorde pessoal, mas ainda assim um pouco frustrante para mim. Mais uma vez na trave. Os 400 km não saíram.
A esperança continua...
Afinal amanhã tem mais...
Rafael Saladini
Link directo para visualizar o voo do Olympio Fayssol de 358 kms realizado no dia 27 de Outubro de 2007.
Acordamos sem muitas pretensões. Uma cmada de estratos forte tapava boa parte do céu. Não existe maneira de saber se o dia será bom sem ir para a rampa. Portanto, mantivémos a disciplina e subimos no mesmo horário de sempre. Os estratos rapidamente começaram a dissipar e as formações matinais melhoraram muito o cenário.
Foi a decolagem mais cedo da minha vida: 6:55h. Oly e Cecéu descolaram dez minutos depois e logo nos encontrámos acima da rampa. Tecto do dia nos tradicionais 800m do chão e a deriva nos levando para sudoeste em direção à rota de Crateús. Formações gordas e com uma actividade constante deram um pequeno exemplo do que seria aquele dia.
No início fiquei um pouco desanimado por nunca ter voado tão longe naquela rota. Para mim, por pura ignorância, não seria um dia que o voo renderia o bastante para voar 430km. Errado. Existem sim muitos buracos e serras que podem atrapalhar a velocidade de cruzeiro, mas também existem passagens que acredito serem o segredo dessa rota. Aprendi voando.
Logo na terceira térmica nos separamos. Na cadeia de monólitos atrás da rampa, os três derivavam com uma bolha muito fraca em direção ao rotor das pedras e para completar ainda havia um juremal daqueles embaixo. Decidi então arriscar sozinho. Uma decisão que facilmente poderia ter me colocado no chão, para fugir daquele impasse e apanhar uma linha de nuvens mais aberta pelo flat em cima do asfalto de Quixeramobim. Deu certo.
Cecéu e Oly derivaram tanto que logo não conseguiam mais penetrar naquele vento Nordeste, canalizado pelos venturis formados pelos Monólitos naquele início de rota, e não conseguiram juntar-se a mim. Não tiveram outra saída a não ser encarar o rotor dos monólitos e tentar salvar o voo por lá mesmo. Enfrentaram uma turbulência desagradável, mas conseguiram encontrar uma saída daquele buraco de juremas.
A partir desse ponto não nos encontrámos mais em voo, com Cecéu e Oly voando pelo topo da cadeia de monólitos à minha direita, e eu sempre aberto pelo flat. Minha rota estava escrita, com um alinhamento de nuvens a 1.000m do chão funcionando perfeitamente e acelerando meus kms iniciais do voo. Mesmo conservador, consegui chegar a Quixeramobim rápido e logo estava a caminho de Boa Viagem.
Cecéu acabou se separando do Oly esticando na frente para tentar emparelhar em rotas diferentes e assim se aproximar de mim em poucos kms. Acabou extremamente baixo para a hora, numa situação complicada, no rotor da serra e sem conseguir subir. Definitivamente a minha decisão lá na terceira térmica do dia me trouxe uma vantagem significativa de posicionamento naquele momento. Além de conseguir percorrer toda a linha rendendo muito bem, me deixou numa posição que me conectou diretamente com outro cloud street logo após Quixeramobim, enquanto Cecéu e Oly acabaram numa região sombreada e atrasaram-se muito.
Os planeios até Boa Viagem renderam bem e fiquei baixo apenas uma vez, logo antes da cidade. Foi um momento delicado, com boa parte da área sombreada e poucas opções obvias de gatilhos. Consegui sair com dificuldade e logo cruzava pela esquerda da cidade, onde de novo consegui voltar à base da nuvem (tecto de 1400m). Cecéu nesse ponto havia recuperado bastante tempo e já se aproximava rápido, tentando conectar comigo para voarmos juntos. Porém, um pouco impaciente, acabou dispensando a sua última bolha de 1,5m/s acreditando que pudesse subir mais forte logo à frente. Caiu às 10:30h.
Com a queda do Cecéu, um desânimo quase me fez cair. O Oly estava 15 km atrás e eu não podia esperá-lo. Outro ponto que me incomodava era que não conhecia mais nada a partir daquele ponto e já havia passado momentos de turbulência severa naquela região em voos anteriores.
Antes de me aventurar pelas serras logo após Boa Viagem, resolvi analisar bem os vales e tentei imaginar os venturis. Muitos vales ali possuem uma tendência nítida de canalizar o vento meteorológico, gerando um cisalhamento forte numa determinada altura, o que pode ser perigoso para pilotos desavisados. Essa análise me posicionou bem para cruzar a serra, e não tive que enfrentar as saias transversais à rota, causa principal da turbulência.
Cheguei a um ponto em que não existe mais opções para evitar as serras, me obrigando a ganhar bastante altura para cruzar a parede com segurança. Por ser uma parede bem formada e com face virada para Leste, era um gatilho perfeito. Coloquei para dentro da núvem e decidi que deveria seguir o voo mesmo sem o Cecéu. A condição parecia redonda e eu não queria desperdiçar aquele dia.
Em dois planeios minha motivação foi sofrendo um revés forte, com uns cirros já tomando conta do horizonte e a condição azulando. Meu objectivo acabou mudando e resolvi que deveria sobreviver até Crateús para almoçar bem por lá. De Boa Viagem para Crateús existe uma área grande pouco habitada e repleta de juremas, com uma única estrada de terra ligando vilas solitárias. Fiquei baixo nessa estrada, pensando que estaria no chão em questão de minutos. Como tinha contacto directo com o resgate, fiquei bem tranquilo. Acabei rastejando por alguns quilómetros e mesmo no azul consegui salvar-me daquela roubada. Oly também não decepcionou, vindo sempre no mesmo ritmo logo atrás de mim.
Sobrevivemos bem até Crateús, separados mas rendendo bem, com o Oly fazendo uma rota um pouco mais pela direita. A condição começou a arredondar bem em Crateús e como a média de velocidade estava boa, resolvi seguir adiante. Em pouco tempo cruzei meu segundo obstáculo, a mesma cordilheira de Poranga mais ao Sul, por Tucuns. Logo estava me deliciando com os canhões fortes que desprendiam do platô, o que acelerou um pouco minha média durante 20 km.
Chegando ao km 300 de voo, o cansaço começou a pegar. Nessa altura do dia, já estava com 8 horas de voo e ainda restavam quase 3 horas de sol. Os 430 km eram perfeitamente possíveis se eu não cometesse mais nenhum erro. Fiz um esforço grande para continuar focado, comendo e me hidratando bem para não deixar o meu ritmo cair. Durante um bom tempo não ficava baixo e acabei cometendo erros logo antes de Castelo do Piauí, onde quase caí. Eram 15h30min e ainda tinha bastante tempo.
O tecto às 15h30m já batia a casa dos 3.000m do chão. Pra quem acha que isso é vantagem, eu pessoalmente discordo. A distância entre as térmicas triplica em relação à manhã, deixando as transições bem mais longas e mais susceptíveis a erro. Esse espaçamento das térmicas ocorre progressivamente durante o voo, e o piloto deve estar preparado para adequar-se a isso. A displicência de cruzar buracos azuis acreditando estar alto suficiente para pegar a próxima pode ser perigoso.
Quando cheguei ao km 340 de voo dei-me conta de que me havia atrasado, e tirando um pouco a esperança de bater os 430 km. Já o Cecéu, que me acompanhava de baixo acreditava que o recorde cairia naquela tarde. A condição estava boa, mas ele me superestimou. Errei algumas vezes no final e acabei me atrasando muito. O Oly também se atrasava constantemente em voo, chegando a ficar por vezes 20km atrás. Meu objectivo passou a ser os 400km.
Por volta do km 360, mesmo sob influência dos cirros, a actividade térmica ainda funcionava bem. Quase cometi um erro fatal que me colocaria no chão às 16h30m. Concentrei-me tanto para não cair que fiquei girando num zerinho por um bom tempo antes de conseguir subir. Mais um erro que me tirou minutos preciosos. Derivei por uns 15 km até ganhar altura, e pelas minhas experiências anteriores de planeios no fim de tarde, para bater os 400kms a partir daquele ponto eu deveria apenas colocar 2500m de altura. Errado.
Nesse momento (17:00h), Oly pousava no km 360, logo antes de Beneditinos, satisfeito com mais um grande voo em seu currículo. Também passou por momentos tensos, muito baixo com mares e mares de juremas logo abaixo. Mais um voo para recordar e uma rota inédita para ele.
Fiz o meu último planeio, saindo de cima da cidade de Beneditinos, com 2600m de altura, já não conseguindo subir mais. Comecei meu último planeio comemorando que havia feito os 400kms. Uma grande ilusão. Saí afundando muito sem entender o que estava acontecendo, afinal eram 17:20h e já não havia mais muita actividade. Teoricamente era pra render muito, mas me renderam apenas vinte e poucos km. Frustrante.
Nos últimos trezentos metros de altura, estiquei para uma estradinha de terra em direcção a vila Lagoa do Piauí (km 415). Nunca tive altura para chegar lá, mas nunca imaginei que fosse ficar tão longe da vila. Resolvi abandonar um pouso mais confortável ao lado de uma casa, para esticar o planeio até onde desse e paguei um preço caro por isso. Em vinte minutos, o sol se pôs completamente e a Lua cheia ainda não havia nascido, uma escuridão desagradável para quem não sabia onde estava e também não tinha ninguém para perguntar. Meu último contacto com o resgate foi logo antes de pousar e fiquei sem falar com o Dióclecio até as 19:30h, ali no meio do nada.
Relutei em caminhar para a casa por causa da escuridão. De cima tudo é tão obvio, as estradas parecem tão simples, mas do chão os parâmetros mudam completamente, ainda mais naquela escuridão total. A "estrada de terra" na verdade não era uma estrada, e sim uma trilha toda acidentada que mal passava um 4x4. Como estava muito cansado e meu ombro estava fadigado, inflamando e doendo muito, por comodidade, resolvi confiar que o Dió chegaria a mim.
Amarrei minha rede em duas árvores e fiquei descansando torcendo para o Dió me achar. Passou-se duas horas que havia pousado e a ansiedade começava a bater. Resolvi que deveria alimentar-me bem. Tinha um litro de água, três barrinhas e uma lata de atum. Meu desgaste em voo havia sido pesado e comecei a sentir-me meio tonto e sonolento. Tirei um cochilo de quinze minutos com o rádio colado nos meus ouvidos. Fui acordado com o resgate tentando contato por volta das 19:30h. As poucas palavras que falei com o Dió me tranquilizaram, afinal ficar no meio do sertão sozinho durante duas horas, sem contacto, na escuridão total e passando mal de cansaço, não é agradável. A Lua cheia começava a nascer, um alívio.
Às 20:00h fui contactado pelo Dió que me informou uma posição apenas 9kms de mim. Comi minha última barrinha e tomei meus últimos goles de água já na certeza de sair dali rápido. Às 21:00h a mesma voz me esclareceu a real situação. Estavam andando em um labirinto onde todos os caminhos terminavam em cercas e propriedades. Era necessário descobrir o nome do local, foi então que resolvi pegar meu GPS, marcar o ponto da minha vela e sair andando naquele caminho de vaca. Caminhei 3 km e cheguei numa casa. Tudo escuro e ninguém ao redor, me deu um medo daquela casa estar abandonada. Gritei e um senhor, muito relutante, resolveu levantar de sua cama para me atender.
Descobri que para chegar a mim o carro deveria dar uma volta enorme até Teresina e voltar através de Lagoa do Piauí. O senhor ma avisou que também havia a possibilidade de caminhar dois km através de uma mata para chegar a outra estrada que encurtaria o tempo em algumas horas. Optei pelo mais rápido. Voltei correndo e busquei minha vela. Até voltar para a fazenda com o equipamento nas costas, já eram 22:00h. Faltavam ainda os tais dois km mata adentro. A explicação do senhor parecia muito simples, mas no caminho tudo parecia confuso. Perdi-me pelas trilhas e em pouco tempo havia perdido a referência.
Eram 22:30h e finalmente encontrei uma casa, após estar completamente perdido naquela mata escura por meia-hora, e ainda passar por um cemitério no meio do nada que me deixou arrepiado. Os locais me guiaram por uma ladeira de pedras que levaria à estrada. Só às 22:50h foi a hora que enxerguei o farol do carro anunciando o sucesso do resgate. Demorou e desgastou, mas foi um sucesso. Tiveram momentos que tive certeza que dormiria no mato. Era um prazer rever meus amigos.
Acordei às 5:30h, descolei às 6:55h, voei durante 10 horas e 40 minutos, pousei as 17:40h, esperei até as 21:00h e caminhei até as 23:00h. Enfim, começamos a voltar para casa. Parámos para comer e decidimos tocar direto para Quixadá madrugada adentro. Chegámos ao hotel às 07h30m do dia 28 de Outubro. Foram 26 horas no ar.
Mais um voo de "quase" 400 km. Total de 398,3km, meu recorde pessoal, mas ainda assim um pouco frustrante para mim. Mais uma vez na trave. Os 400 km não saíram.
A esperança continua...
Afinal amanhã tem mais...
Rafael Saladini
Friday, October 26, 2007
Relato do recordista Marcelo "Ceceu" Prieto - 414 km
Link directo para visualizar o voo de 414 kms
Chegamos à rampa por volta das 7:00h e verificamos que o vento estava perfeito para descolar. Resolvemos descolar o mais cedo possível para evitar uma descolagem perigosa mais tarde, quando a atividade térmica se soma ao vento.
O dia amanheceu azul prometendo condições perfeitas para bater o recorde. No entanto, durante os momentos iniciais do voo, o cenário foi mudando radicalmente, com uma camada de estratos densa condensando acima dos primeiros cumulus do dia e sombreando a rota. Um desânimo inicial quase atrapalhou o dia que proporcionaria o primeiro voo acima de 400km no Brasil.
Resolvemos nos manter acima da descolagem e esperar para fazer a primeira tirada, para não correr o risco de um prego matinal, o que seria desastroso. Decidimos enrolar até as 8:10h para garantir uma saída mais confortável. Decisão que talvez tenha salvado o dia.
Nos primeiros 20 km, chegamos a ficar baixo algumas vezes, com chances enormes de aterrar logo cedo. Porém o dia não nos decepcionou e conseguimos nos arrastar até ao km 50. Após um início complicado e muito difícil, pensávamos que já não cairíamos mais. Essa confiança toda nos traiu quando tomamos a primeira decisão errada do dia, onde acabamos ficando quase no chão logo antes de Madalena (km 60), abaixo de um cumulo que aparentava actividade, mas que já se dissipava.
Nossa dupla, Rafael e eu, trabalhamos muito bem no início, salvando o voo algumas vezes. Infelizmente, o trabalho de grupo acabou ali, com o Rafael aterrando às 10:15h.
O Céu a essa hora já prometia, com um alinhamento muito bem formado até Monsenhor Tabosa (km 120). Consegui seguir essa linha até o final, no pé da cordilheira de Tabosa.
Ao chegar à Serra de Tabosa, não conseguia entender porque o vento havia inclinado na direcção sudoeste, me jogando para a esquerda da cordilheira, local que não acredito ser dos mais seguros, principalmente com vento nordeste.
Cheguei a ficar a duzentos metros do chão na esquerda do platô de Tabosa. Nem podia imaginar onde estava me metendo. Em poucos minutos me dei conta de que aquele local, um venturi no ponto mais alto da serra, não era local seguro para voar. Uma sessão de colapsos e avanços fortíssimos chegou a fazer com que, por um breve momento, só quisesse encontrar uma aterragem segura.
Durante quinze minutos, imaginei jogar o reserva e salvar-me daquela situação horrorosa e totalmente sem controle na qual havia me metido. Mas consegui manter a frieza até ser cuspido para a planície de Tamboril. Passado o terror da Serra de Tabosa, tive a impressão de que dali em diante tudo melhoraria e que o voo ficaria mais seguro.
O tecto subiu para 3.000m do mar logo às 11:30h, o que me permitiu aumentar muito a média de velocidade até a Serra de Poranga (km 200). Em Ipaporanga, logo antes da serra, peguei a térmica mais forte da minha vida, com picos de 13 m/s e média (5s) de 10,5m/s. Pulei para o platô de Poranga pela esquerda da cidade numa altura confortável. Imaginei que se o voo rendesse ali, o recorde estaria garantido.
O único "porém" foi que o vento não estava alinhado com a rota tradicional (a de Pedro II), me jogando mais ao sul, região que desconhecia e que n¦ão aparentava ter muitas opções de aterragem e quase nenhuma estrada. Meu segundo momento de terror estava por vir. Um mar de juremas me esperava logo abaixo. Acabei errando e entrando numa descendente forte que quase me derrubou, me deixando a cem metros do chão, completamente vendido. A última opção de aterragem estava logo à minha frente e eu derivava com uma bolha muito fraca (0,5m/s) tentando subir pela última vez antes de optar pela aterragem.
Quando me aproximei da última clareira, tentei voar contra-vento para aterrar nela. Não foi uma boa ideia, pois comecei a voar para trás e percebi que se continuasse tentando acabaria nas juremas do mesmo jeito. A bolha era a minha única saída daquela situação, pois se aterrasse ali só me restaria uma opção: dormir no mato até que o resgate, com a ajuda de alguns locais da região, conseguisse me localizar e abrir caminho naquele labirinto de juremas. Com o estómago retorcido e muito baixo, mal conseguia passar minha posição para o resgate.
Resolvi que nada nesse mundo me tiraria daquela bolha, e derivei por uns quinze longos minutos até atingir 700m do chão e só ai consegui respirar novamente. A bolha acabou sumindo e minha opção foi continuar tocando com vento de cauda até encontrar uma aterragem segura.
Avistei algumas casas à minha esquerda e torci para ter altura suficiente para chegar mais perto delas. Foi aí que minha sorte começou a mudar. Arrastei-me em direcção ao povoado, batendo por fim numa bolha um pouco mais forte, que me segurou até que um grupo de urubus me levou até uma boa térmica e me tirou daquele buraco. Minha única vontade naquele momento era colocar na base da nuvem (3.200m) e fugir daquela roubada, mas não cheguei nem perto. Cheguei somente a uns 1.800m do chão, e o ciclo dissipou-se.
Àquela altura já podia voltar a pensar no recorde. Avistei uma nuvem bem formada a uns 8 km de mim e não hesitei em tocar para lá. O Dioclécio (resgate) me avisou que minha média estava óptima. Motivado, encarei umas formações de pedras muito baixo acreditando que salvariam meu voo. Caso isso não ocorresse, ao menos havia uma casa e uma opção segura de aterragem, o que me deixou bem mais tranquilo.
Minha transição não rendeu e acabei voltando a ficar muito baixo em mais um mar de juremas com aquela casa solitária sendo meu único ponto de apoio. Estava quase fazendo aproximação para pousar quando bati numa térmica de 4m/s e acabei ganhando altura suficiente para fazer a transição para a nuvem seguinte. Perguntei para o Dió nesse momento o nome da cidade naquela proa e ele me passou o município de Campo Maior (350 km). Tocando para lá, finalmente voltei a sentir o cheiro de humidade, percorrendo alguns quilómetros na base da nuvem, um presente depois dos momentos de tensão próximos do chão. A possibilidade de bater o recorde sul-americano era grande, pois eram 16:00h e eu já estava no km 360.
Foi então que a sorte mais uma vez não contribuiu, pois no final da linha de nuvens havia um grande buraco azul com uma camada grande e espessa de cirrus sombreando e acabando com a condição prematuramente (16:30h). Segui para o planeio final, na direcção da cidade José de Freitas (390 km), me segurando em bolhas fracas e falhadas para garantir pelo menos os 400km.
Conferindo no GPS, achei um ponto - P01 que acreditei ser a coordenada da rampa. Normalmente, chamo a rampa de P01 em todas as localidades que costumo voar, porém dessa vez não sei o que ocorreu, mas o P01 do meu GPS era a coordenada de um pouso que havia feito em um dos meus pregos nos dias anteriores. Voei meus últimos quilómetros me baseando erroneamente nessa coordenada, acreditando estar perto de transpor a barreira dos 400km, quando na verdade já havia passado dos 400km e já estava fazendo o planeio para os 415km. Só descobri esse facto no dia seguinte.
No planeio final, fiquei sem muita escolha, pois havia um colchão de palmeiras e cajueiros que não me permitiriam um pouso seguro. Após passar por todos aqueles momentos de pura tensão e stress psicológico durante o voo, certamente foi uma decisão corretíssima não esticar o planeio somente para ganhar mais um quilómetro no recorde.
A questão é que o cirrus não me permitiu voltar para a base da nuvem após aquela linha maravilhosa que havia percorrido, por isso fiz de tudo para maximizar meu planeio final e não tive chances de voltar a subir para esticar ainda mais meu voo.
Avisei o Dió que minha marca era de 399km, e nem imaginei que havia feito o voo mais longo da minha vida. Os momentos difíceis e delicados que passei não foram em vão.
Enfim meu sonho realizado após anos de dedicação e muitas temporadas no sertão. Pela primeira vez na história um piloto transpõe a barreira dos 400km descolando de uma rampa natural, sendo esse voo feito por um brasileiro, com equipamento nacional e no Brasil. Sem dúvida um dia pra lá de especial.
Foram 10 horas e 20 minutos de duração para percorrer 415km, decolando de Quixadá-CE e pousando em José de Freitas-PI. A SOL merece depois de anos investindo no desporto, buscando a marca dos 400km no Brasil, quase atingida na semana anterior por meu parceiro e aluno Rafael Saladini, que voando sozinho não atingiu por apenas 2,3 km, o que mostra claramente a evolução no desenvolvimento de seus equipamentos.
Deixo aqui um agradecimento especial para o projectista da SOL André Rottet, que com uma enorme competência conseguiu desenvolver essa asa especial que é o Tracer 11, que me permitiu enfrentar todas as situações extremas desse voo comportando-se de forma excelente para uma asa da categoria. Agradeço ao Ary e Fernando Pradi, por sempre me apoiarem, acreditando em meus sonhos. Obrigado Dióclécio pelo apoio constante, na função de "co-piloto", me estimulando e dando confiança nos momentos mais difíceis. Sua função na expedição XCNordeste é, sem dúvida, de suma importância para a segurança dos pilotos. Agradeço ao meu parceiro André Fleury, que durante muitos anos me acompanhou e me ensinou muito sobre esse lugar. Ao Rafael Saladini pela parceria durante a Expedição XCNordeste e por me ajudar muito durante os momentos iniciais desse e de muitos outros vos. Seguimos nossos sonhos, voando... Abraço a todos.
Marcelo Prieto, o Cecéu.
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Chegamos à rampa por volta das 7:00h e verificamos que o vento estava perfeito para descolar. Resolvemos descolar o mais cedo possível para evitar uma descolagem perigosa mais tarde, quando a atividade térmica se soma ao vento.
O dia amanheceu azul prometendo condições perfeitas para bater o recorde. No entanto, durante os momentos iniciais do voo, o cenário foi mudando radicalmente, com uma camada de estratos densa condensando acima dos primeiros cumulus do dia e sombreando a rota. Um desânimo inicial quase atrapalhou o dia que proporcionaria o primeiro voo acima de 400km no Brasil.
Resolvemos nos manter acima da descolagem e esperar para fazer a primeira tirada, para não correr o risco de um prego matinal, o que seria desastroso. Decidimos enrolar até as 8:10h para garantir uma saída mais confortável. Decisão que talvez tenha salvado o dia.
Nos primeiros 20 km, chegamos a ficar baixo algumas vezes, com chances enormes de aterrar logo cedo. Porém o dia não nos decepcionou e conseguimos nos arrastar até ao km 50. Após um início complicado e muito difícil, pensávamos que já não cairíamos mais. Essa confiança toda nos traiu quando tomamos a primeira decisão errada do dia, onde acabamos ficando quase no chão logo antes de Madalena (km 60), abaixo de um cumulo que aparentava actividade, mas que já se dissipava.
Nossa dupla, Rafael e eu, trabalhamos muito bem no início, salvando o voo algumas vezes. Infelizmente, o trabalho de grupo acabou ali, com o Rafael aterrando às 10:15h.
O Céu a essa hora já prometia, com um alinhamento muito bem formado até Monsenhor Tabosa (km 120). Consegui seguir essa linha até o final, no pé da cordilheira de Tabosa.
Ao chegar à Serra de Tabosa, não conseguia entender porque o vento havia inclinado na direcção sudoeste, me jogando para a esquerda da cordilheira, local que não acredito ser dos mais seguros, principalmente com vento nordeste.
Cheguei a ficar a duzentos metros do chão na esquerda do platô de Tabosa. Nem podia imaginar onde estava me metendo. Em poucos minutos me dei conta de que aquele local, um venturi no ponto mais alto da serra, não era local seguro para voar. Uma sessão de colapsos e avanços fortíssimos chegou a fazer com que, por um breve momento, só quisesse encontrar uma aterragem segura.
Durante quinze minutos, imaginei jogar o reserva e salvar-me daquela situação horrorosa e totalmente sem controle na qual havia me metido. Mas consegui manter a frieza até ser cuspido para a planície de Tamboril. Passado o terror da Serra de Tabosa, tive a impressão de que dali em diante tudo melhoraria e que o voo ficaria mais seguro.
O tecto subiu para 3.000m do mar logo às 11:30h, o que me permitiu aumentar muito a média de velocidade até a Serra de Poranga (km 200). Em Ipaporanga, logo antes da serra, peguei a térmica mais forte da minha vida, com picos de 13 m/s e média (5s) de 10,5m/s. Pulei para o platô de Poranga pela esquerda da cidade numa altura confortável. Imaginei que se o voo rendesse ali, o recorde estaria garantido.
O único "porém" foi que o vento não estava alinhado com a rota tradicional (a de Pedro II), me jogando mais ao sul, região que desconhecia e que n¦ão aparentava ter muitas opções de aterragem e quase nenhuma estrada. Meu segundo momento de terror estava por vir. Um mar de juremas me esperava logo abaixo. Acabei errando e entrando numa descendente forte que quase me derrubou, me deixando a cem metros do chão, completamente vendido. A última opção de aterragem estava logo à minha frente e eu derivava com uma bolha muito fraca (0,5m/s) tentando subir pela última vez antes de optar pela aterragem.
Quando me aproximei da última clareira, tentei voar contra-vento para aterrar nela. Não foi uma boa ideia, pois comecei a voar para trás e percebi que se continuasse tentando acabaria nas juremas do mesmo jeito. A bolha era a minha única saída daquela situação, pois se aterrasse ali só me restaria uma opção: dormir no mato até que o resgate, com a ajuda de alguns locais da região, conseguisse me localizar e abrir caminho naquele labirinto de juremas. Com o estómago retorcido e muito baixo, mal conseguia passar minha posição para o resgate.
Resolvi que nada nesse mundo me tiraria daquela bolha, e derivei por uns quinze longos minutos até atingir 700m do chão e só ai consegui respirar novamente. A bolha acabou sumindo e minha opção foi continuar tocando com vento de cauda até encontrar uma aterragem segura.
Avistei algumas casas à minha esquerda e torci para ter altura suficiente para chegar mais perto delas. Foi aí que minha sorte começou a mudar. Arrastei-me em direcção ao povoado, batendo por fim numa bolha um pouco mais forte, que me segurou até que um grupo de urubus me levou até uma boa térmica e me tirou daquele buraco. Minha única vontade naquele momento era colocar na base da nuvem (3.200m) e fugir daquela roubada, mas não cheguei nem perto. Cheguei somente a uns 1.800m do chão, e o ciclo dissipou-se.
Àquela altura já podia voltar a pensar no recorde. Avistei uma nuvem bem formada a uns 8 km de mim e não hesitei em tocar para lá. O Dioclécio (resgate) me avisou que minha média estava óptima. Motivado, encarei umas formações de pedras muito baixo acreditando que salvariam meu voo. Caso isso não ocorresse, ao menos havia uma casa e uma opção segura de aterragem, o que me deixou bem mais tranquilo.
Minha transição não rendeu e acabei voltando a ficar muito baixo em mais um mar de juremas com aquela casa solitária sendo meu único ponto de apoio. Estava quase fazendo aproximação para pousar quando bati numa térmica de 4m/s e acabei ganhando altura suficiente para fazer a transição para a nuvem seguinte. Perguntei para o Dió nesse momento o nome da cidade naquela proa e ele me passou o município de Campo Maior (350 km). Tocando para lá, finalmente voltei a sentir o cheiro de humidade, percorrendo alguns quilómetros na base da nuvem, um presente depois dos momentos de tensão próximos do chão. A possibilidade de bater o recorde sul-americano era grande, pois eram 16:00h e eu já estava no km 360.
Foi então que a sorte mais uma vez não contribuiu, pois no final da linha de nuvens havia um grande buraco azul com uma camada grande e espessa de cirrus sombreando e acabando com a condição prematuramente (16:30h). Segui para o planeio final, na direcção da cidade José de Freitas (390 km), me segurando em bolhas fracas e falhadas para garantir pelo menos os 400km.
Conferindo no GPS, achei um ponto - P01 que acreditei ser a coordenada da rampa. Normalmente, chamo a rampa de P01 em todas as localidades que costumo voar, porém dessa vez não sei o que ocorreu, mas o P01 do meu GPS era a coordenada de um pouso que havia feito em um dos meus pregos nos dias anteriores. Voei meus últimos quilómetros me baseando erroneamente nessa coordenada, acreditando estar perto de transpor a barreira dos 400km, quando na verdade já havia passado dos 400km e já estava fazendo o planeio para os 415km. Só descobri esse facto no dia seguinte.
No planeio final, fiquei sem muita escolha, pois havia um colchão de palmeiras e cajueiros que não me permitiriam um pouso seguro. Após passar por todos aqueles momentos de pura tensão e stress psicológico durante o voo, certamente foi uma decisão corretíssima não esticar o planeio somente para ganhar mais um quilómetro no recorde.
A questão é que o cirrus não me permitiu voltar para a base da nuvem após aquela linha maravilhosa que havia percorrido, por isso fiz de tudo para maximizar meu planeio final e não tive chances de voltar a subir para esticar ainda mais meu voo.
Avisei o Dió que minha marca era de 399km, e nem imaginei que havia feito o voo mais longo da minha vida. Os momentos difíceis e delicados que passei não foram em vão.
Enfim meu sonho realizado após anos de dedicação e muitas temporadas no sertão. Pela primeira vez na história um piloto transpõe a barreira dos 400km descolando de uma rampa natural, sendo esse voo feito por um brasileiro, com equipamento nacional e no Brasil. Sem dúvida um dia pra lá de especial.
Foram 10 horas e 20 minutos de duração para percorrer 415km, decolando de Quixadá-CE e pousando em José de Freitas-PI. A SOL merece depois de anos investindo no desporto, buscando a marca dos 400km no Brasil, quase atingida na semana anterior por meu parceiro e aluno Rafael Saladini, que voando sozinho não atingiu por apenas 2,3 km, o que mostra claramente a evolução no desenvolvimento de seus equipamentos.
Deixo aqui um agradecimento especial para o projectista da SOL André Rottet, que com uma enorme competência conseguiu desenvolver essa asa especial que é o Tracer 11, que me permitiu enfrentar todas as situações extremas desse voo comportando-se de forma excelente para uma asa da categoria. Agradeço ao Ary e Fernando Pradi, por sempre me apoiarem, acreditando em meus sonhos. Obrigado Dióclécio pelo apoio constante, na função de "co-piloto", me estimulando e dando confiança nos momentos mais difíceis. Sua função na expedição XCNordeste é, sem dúvida, de suma importância para a segurança dos pilotos. Agradeço ao meu parceiro André Fleury, que durante muitos anos me acompanhou e me ensinou muito sobre esse lugar. Ao Rafael Saladini pela parceria durante a Expedição XCNordeste e por me ajudar muito durante os momentos iniciais desse e de muitos outros vos. Seguimos nossos sonhos, voando... Abraço a todos.
Marcelo Prieto, o Cecéu.
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